sábado, 18 de junho de 2016




VAYA COM DIÓS, DUNGA!

Reproduzo abaixo uma pequena postagem que o jornalista Carlos Andrade, meu amigo há trinta e cinco anos, me enviou através da rede social. Pontual e crítico, ele anteviu a traulitada que Dunga e o seu incrível exército de Brancaleone levariam do Peru, antigo freguês de caderneta. A reprodução do texto foi devidamente autorizada pelo autor, e a formatação sem parágrafos obedece à técnica utilizada nas postagens de rede social:

“A natural goleada do Brasil diante do Haiti de 7x1 lembrou, pelo resultado, o tamanho da nossa seleção quando joga com outra de verdade, como foi o caso da Alemanha na Copa do Mundo, no Brasil. Naquele momento, o Haiti era aqui. E, se depender de Dunga e de empates sem gols como com o Equador, ainda vai continuar sendo por muito tempo. Oxalá o Brasil perca para o Peru e não avance na competição. Só assim, e somente assim, a seleção que já teve orgulho de ser canarinho deixe de ser comandada por um anão no apelido e, pior, nas decisões profissionais que o cargo de treinador exige dele. Dos oito gols da partida sete foram por erros do Haiti e um por mérito do Haiti. Ou seja, para o Brasil, restou fazer o jogo da estreia: o 0x0. Agora vai decidir se vai ou vem contra o Peru. Uma derrota permitirá ao país uma situação inimaginável: sofrer na humilhação do 7x1 e chorar na obrigação dos 7x1.”

Como resposta, depois da desclassificação sacramentada, eu respondi:

“Como em tudo na vida, o futebol também evoluiu. Novos conceitos, novo tipo de preparação, novas exigências, tudo isso fez o futebol mundial tomar caminhos diferentes nos últimos vinte anos. E, enquanto todos buscaram alternativas e estudaram novas fórmulas para crescer, o Brasil parou. Não é à toa que os nossos jogadores, salvo algumas exceções, deixaram de ser ídolos nos demais países, e também não é à toa que os nossos técnicos não conseguem emplacar em times do exterior – semana passada Luxemburgo e Mano Menezes foram demitidos de clubes da segunda divisão chinesa! Ficar em terceiro lugar – e ser eliminado – em um grupo que tinha Equador, Peru e Haiti mostra que estamos cada vez “mais pequenos”. Sem desculpa pelo gol peruano ter sido feito com o braço. Afinal, deixamos de perder na estreia porque o árbitro não validou um gol legítimo dos equatorianos. Além disso, não fizemos um só gol no Equador nem no Peru. Os sete marcados contra o Haiti não valem. O Haiti ainda é pior do que o Brasil. E olhem que eu estou falando de futebol...”  

Faz muito tempo que eu venho criticando a falta de cuidado com que é tratada a seleção brasileira pelos seus responsáveis. Os motivos são vários, mas tudo indica que o principal deles é que atletas e dirigentes ainda ostentam a ilusão de que praticamos o melhor futebol do mundo, que todos os nossos jogadores são craques, que os europeus são uns cinturas-duras, que os sul-americanos são nossos eternos fregueses e que todos tremem quando vêm a camisa amarela crescer diante deles.
Com base nestes conceitos o futebol brasileiro não evoluiu, nem na organização, nem na orientação tática ou técnica, nem no tipo de treinamento, nem na cabeça dos jogadores. 
Especificamente, a falta de competência e de estatura de Dunga vem de longe. Ele sempre mostrou falta de habilidade, seja na convocação, na escalação e na orientação, mas isso não foi levado em conta mesmo tendo o Brasil perdido a Copa América de 2015 para o Paraguai e mesmo ocupando no momento a sexta colocação nas Eliminatórias para a Copa de 2018.
Com Dunga, o Brasil ganhava amistosos inúteis contra adversários sem pedigree ou sem interesse, porque tais amistosos não adicionavam tecnicamente nada a ninguém.
Agora, a três meses da sétima rodada das Eliminatórias, Tite é finalmente convidado para exercer o comando técnico, sonho de consumo do torcedor brasileiro (com exceção do corintiano, que vê a saída do seu técnico vitorioso com bastante apreensão).
A seleção olímpica vai ficar sob o comando de Rogério Micale, nada mais justo, porque foi ele quem conduziu o trabalho até agora. Sua missão será ganhar uma medalha – e para a opinião pública só a de ouro vale – e mostrar ascendência dobre o grupo de jogadores acima de 23 anos, entre eles Neymar, única presença já confirmada na lista de 35 até o momento em que este artigo foi escrito.
Começamos um novo tempo depois de uma era de trevas.
Seja bem-vindo, Tite. “Vaya com Diós”, Dunga!

  



(artigo publicado no caderno Super Esportes do jornal O Imparcial de 17/06/2016)



segunda-feira, 13 de junho de 2016






RECEITA PARA SAIR DA CRISE

O jogador Douglas Costa, atacante do Bayern München foi cortado da seleção brasileira que disputa a Copa América nos Estados Unidos por motivo de contusão.
Em Porto Alegre, onde aproveitou a parada das atividades na Europa para descansar lado da família, ele concedeu uma entrevista para o jornal Zero Hora, onde assinalou alguns pontos que entram em sintonia com a minha forma de analisar a decadência do futebol brasileiro.
Para ele, os principais problemas se resumem ao exercício da técnica, à aplicação tática e a um técnico competente.
Expressando-se com muita clareza – e com muito cuidado para não cair em desgraça com a CBF, apesar de ter colocado Dunga numa posição não muito confortável – ele criticou o futebol praticado por aqui, disse que estamos precisando de um Pepe Guardiola e que nenhum time brasileiro teria condições de disputar uma Champions League, cujo nível é bem mais elevado.
Na semana passada eu mencionei que iria tocar neste assunto com mais profundidade, e a entrevista de Douglas Costa abriu a deixa que eu precisava.
Trocando em miúdos, os problemas do futebol brasileiro podem ser divididos em três partes.
Primeiro a CBF, que é responsável pela organização e pelo calendário.
Do jeito que está, com os clubes disputando múltiplos torneios durante todo o ano, os atletas não têm como treinar, pois sua vida se resume ao ciclo “jogo-viagem-reapresentação-avaliação física-viagem-hotel-jogo-viagem...”, e por aí segue.
A CBF perdeu a sensibilidade de administrar o futebol como um todo e está mais preocupada com aquilo que sempre deveria ter sido o seu “métier”, ou seja, a seleção brasileira. Ocorre que na atual conjuntura, o presidente está trabalhando com uma espada pendurada e balançando sobre a cabeça e tem dificuldades para manter os contratos de patrocínio vitais para que as seleções possam se manter em atividade. O futebol da seleção proncipal perdeu muito do seu poder de venda, pois deixou de proporcionar espetáculo, e tudo isso acaba por força deixando o futebol dos clubes em segundo plano.
É mais que chegada a hora de ser feito um grande pacto entre a CBF e os clubes a fim de fundar uma Liga sólida e séria que administre o futebol dos clubes como um todo. As pequenas ligas piratas, solitárias, dissidentes, ranzinzas e sem força – como a atual Primeira Liga – só ajudam a tumultuar, pois não têm força nem legitimidade.
Em segundo lugar, nossos técnicos estão vinte anos atrasados com relação aos de outros países – inclusive os sul-americanos.
A forma de jogar dos times estrangeiros, mesmo quando contam com jogadores não mais que razoáveis, mostra um futebol de ocupação de espaços, deslocamentos, toque rápido de bola e muita dedicação, e nada disso se vê nos clubes brasileiros por falta de orientação e acompanhamento técnico.
Nossos técnicos “não dão certo” no exterior, e deve existir uma boa razão para isso; ainda esta semana, dois medalhões brasileiros (Vanderlei Luxemburgo e Mano Menezes) foram demitidos de dois clubes da segunda divisão chinesa.
Por outro lado, os técnicos estrangeiros que chegam para treinar equipes brasileiras lutam com a maior dificuldade para impor uma filosofia de jogo, face ao sistema viciado que atualmente é utilizado nos clubes – vide Edgardo Bauza (São Paulo), Juan Carlos Osorio (ex-São Paulo) e Paulo Bento (Cruzeiro).
Por último, o rendimento das equipes poderia ser melhor se os jogadores se preocupassem mais em treinar fundamentos essenciais para a prática da sua profissão do que com o “hair stylist”, com as boutiques da moda, com as baladas de funk, pagode e sertanejo, com a exposição ao lado das Maria-Chuteiras e com as horas gastas fazendo selfies ou tuitando bobagens.
Jogadores como Zico e Rogério Ceni, só para citar alguns, passavam horas depois dos treinos oficiais aprimorando a cobrança de faltas e pênaltis, e às vezes pagavam do próprio bolso para ter a companhia de um jogador das categorias de base ajudando no treinamento.
Cafu foi transformado por Telê Santana de um limitado volante a um lateral que ajudou a potencializar a função de “ala” no futebol mundial. Nele, Telê aprimorou também a cobrança de escanteios e os cruzamentos mortais para a grande área adversária.
Ter talento é uma coisa. Fazer bom uso do talento é algo bem diferente.     


 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 10/06/2016)