sábado, 3 de dezembro de 2016





A HORA DO RECOMEÇO

A imprensa e a opinião pública já disseram tudo o que tinha que ser dito a respeito da tragédia aérea nos arredores de Medellin, portanto não vou descer a detalhes.
A única coisa que eu posso acrescentar é estritamente pessoal, pois diz respeito não a análises técnicas ou esotéricas, mas ao meu próprio sentimento, ligado que sou às coisas da bola.
Ao executar um trabalho voltado para o esporte – em particular ao futebol – o comentarista se habitua a frequentar um meio do qual ele fisicamente não faz parte, mas cria intimidades.
E, ao acompanhar os jogos, ouvir entrevistas, se imiscuir no dia a dia das equipes e participar da efervescência que cerca as partidas antes, durante e depois da sua realização, além de discutir consigo mesmo ou com uma pessoa próxima o que está sendo dito numa mesa redonda, o comentarista se torna amigo dos profissionais do esporte, sejam eles jogadores, membros da comissão técnica ou jornalistas que fazem a cobertura dos clubes ou dos eventos.
Assim, com a queda do avião da LAMIA, perdi diversos amigos que participavam comigo, sem que soubessem, de incontáveis horas de lazer.
Isso acontece com o espectador de novelas, com o cinéfilo ou com o tiete de cantores famosos. A pessoa se sente próxima do artista como se ele fosse seu amigo particular ou parente próximo. 
Isso explica a comoção que sentimos quando uma tragédia ocorre na nossa proximiidade, seja esta proximidade física ou emocional, pois percebemos que a catástrofe está ao nosso redor e que quem quer que reja o nosso destino coloca o perigo num patamar imponderável a poucos passos da gente. Aí ficamos sobressaltados como uma barata com as antenas ligadas, sentindo o perigo que ronda por perto, pois como dizia Billy Blanco, “a bruxa, que é cega”, esbarra na gente e a vida estanca”.
É claro que nos é igualmente pesaroso um acidente aéreo que mate toda uma delegação de rúgbi da Nova Zelândia ou de ginástica artística da China, mas nestes casos nós aqui, no Brasil, digerimos o pesar de uma forma mais tranquila, pois estamos longe das lágrimas do povo e da comoção causada.
Mas no caso da Chapecoense, ver o fim de uma equipe da Série A, muitas vezes mostrada nas quartas-feiras ou nos domingos na tela da nossa televisão, representa para os brasileiros um choque doloroso.
Já nos habituáramos a ver os jogadores da Chapecoense mostrando técnica e brio e já estávamos cientes do poderio daquele time, vencesse ou não a final da Copa Sul-Americana. Afinal, seus jogadores estiveram o ano todo numa posição de destaque, e muitos deles já estavam nos planos de outros grandes clubes para reforçar o elenco em 2017.
Para uma equipe considerada pequena, a Chape até que faz uma boa campanha no Campeonato Brasileiro: faltando uma rodada está entre os dez primeiros colocados – em nono, no caso – e obteve resultados importantes como vencer Botafogo e Fluminense no Rio de Janeiro, acumular vitórias em casa contra São Paulo, Internacional, Botafogo e Cruzeiro e empatar com Flamengo, São Paulo e Cruzeiro no campo dos adversários.
Chegou à semifinal da Copa do Brasil, sendo eliminado no detalhe pelo Atlético Mineiro e foi o único time brasileiro que chegou este ano à final de um torneio intercontinental – a Copa Sul-Americana – final que infelizmente não chegou a disputar.
É hora de recomeço. Com a ajuda de todos, a Chape tem que sobreviver à tragédia e tocar a bola pra frente. Não esqueçam que para encerrar a temporada o time ainda tem que cumprir uma partida contra o Atlético Mineiro pelo Brasileirão 2016, jogando em casa, na Arena Condá.
Os sobreviventes vão à luta.  


(Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 02/12/2016)