sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015





A SAGA DO MARACANà

(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 06/02/2015) 

Quando nasceu, o Estádio Municipal do Maracanã foi batizado como Estádio Jornalista Mário Filho, naqueles tempos em que arena era apenas “um espaço coberto de areia, no centro dos anfiteatros onde combatiam os gladiadores”, conforme dizem os dicionários.
Os puxa-sacos da época queriam denominá-lo Estádio General Ângelo Mendes de Morais, nome do prefeito do Rio de Janeiro, mas prevaleceu a vontade popular, posto que Mário Filho – irmão do dramaturgo Nelson Rodrigues – foi o verdadeiro mentor da obra, a princípio muito contestada.
A inauguração aconteceu no dia 16 de junho de 1950, numa partida entre as seleções do Rio e de São Paulo, vencida pelos paulistas por 3x1. O jogo correspondeu a um teste final do gramado e vestiários, pois a Copa do Mundo seria iniciada oito dias depois com o estádio ainda em obras, tendo o Brasil goleado o México por 4x0.
O jovem Maracanã foi palco de uma tragédia exatamente um mês depois de inaugurado, com o Uruguai calando 200 mil torcedores que comemoravam o título antecipadamente depois da estrondosa goleada sobre a Espanha – 6x0 – três dias antes.
Mas o saldo positivo de alegrias acabou superando as tristezas da Copa.
Por mais de sessenta anos o estádio foi palco dos clássicos cariocas e foi o teatro que abrigou a decisão de mais de uma centena de títulos diversos. Serviu de passarela para que Zizinho, Didi, Nilton Santos, Garrincha, Gerson, Zico, Roberto Dinamite e Romário encantassem o público com o seu grande futebol.
O estádio viveu também outros momentos de alegria, com diversas finais do Campeonato Brasileiro e com a final do primeiro Mundial de Clubes da Fifa e da Copa das Confederações de 2013, e foi a casa do Santos F.C. na conquista do bicampeonato Intercontinental de Clubes 1962-1963, além de testemunhar o milésimo gol de Pelé. Foi o local da abertura e do encerramento do Pan-2007 e presenteou a seleção brasileira feminina com a medalha de ouro.
Com tudo isso, o Maracanã pode e deve ser considerado um patrimônio nacional e, literalmente, a casa do povo, pois abrigava desde o mais humilde torcedor – aquele que não tinha dinheiro para ingressos caros e assistia aos jogos em pé, no cimentão da geral – até os mais sofisticados que se aboletavam nas arquibancadas e nas cadeiras.
Esse pessoal tinha nome: a classe proletária era chamada de “geraldinos” e os mais burgueses conhecidos como “arquibaldos”. Nunca se viu tanta democracia, sem qualquer resquício de luta de classes, pois a galera se preocupava apenas em incentivar os seus craques e os seu clubes.
Botafoguenses, rubro-negros, tricolores e vascaínos, no meio das bandeiras e faixas, dos torcedores fantasiados, dos foguetes, do pó de arroz e do papel picado, faziam a festa do domingo depois da praia.
Mas veio a Copa do Mundo de 2014 e o sonho acabou.
A arquitetura que guardava a marca dos anos 1950 foi desfigurada. A geral foi destruída em nome do padrão Fifa. O comportamento do torcedor foi regulamentado. E os preços foram para a estratosfera, para satisfazer os lucros de um Consórcio que, ao invés da Prefeitura do Rio, passou a administrar o estádio.
Os clubes perderam dinheiro e motivação e a qualidade do futebol carioca sofreu um baque.
Os atuais administradores possivelmente detestam futebol, pois estão impondo as maiores dificuldades para que os clubes usem o estádio. Assim, é de se esperar que o outrora Gigante do Maracanã venha algum dia se chamar Maracanã Music Hall ou quem sabe Maracanã Follies, para abrigar um público bem diferente daqueles saudosos arquibaldos e geraldinos.  

 

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015







IDIOTAS NO COMANDO  

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 03/02/2015) 

Existe um preceito jornalístico que limita o tempo de pergunta e a objetividade da resposta nos programas de entrevistas, tudo pautado na boa educação e no respeito que ambos – entrevistador e entrevistado – devem ter entre si e com o espectador. Esta regra vale para qualquer que seja o assunto em questão, seja ele de natureza científica, política, econômica ou educacional, seja ele sobre o nosso brejeiro futebol.
Interrupções no discurso são indesejáveis, como é indesejável impedir que a outra parte desenvolva o seu raciocínio quando tenta fazer com que a conversa fique mais clara para o público espectador.
Ao longo do tempo, porém, nos acostumamos a ver nas entrevistas esportivas muitos dirigentes e técnicos desequilibrados dando declarações arrogantes e muitas vezes ofensivas e não admitindo qualquer tipo de diálogo. São os “donos da verdade”.
Já nos habituamos a ver e ouvir as fanfarronices do chefão Eurico Miranda e a ironia do professor Vanderlei Luxemburgo, a insolência de Dunga, a má educação de Andrés Sanchez e soberba de Ricardo Teixeira. Também já estamos cansados das respostas mal-humoradas de Muricy Ramalho e Émerson Leão.
A maioria das entrevistas, no entanto, termina de uma maneira tranquila, com pedidos de desculpas explícitos ou embutidos.
Não foi o que aconteceu na semana passada, quando tivemos a oportunidade de assistir ao suprassumo da estupidez em que se transformou a entrevista de Mario Gobbi, atual presidente do Corinthians – que está de saída, para a felicidade do torcedor corintiano – no programa Bate Bola da hora do almoço na ESPN Brasil.
Ao invés de responder aos comentaristas com clareza e objetividade, o presidente esbravejou durante meia-hora sem dar espaço aos interlocutores, tendo o cuidado de afirmar que os jornalistas não estavam preparados para lhe fazer perguntas e se colocou num pedestal que, ao invés de traduzir conhecimento, demonstrou apenas falta de educação e ignorância.
Tudo começou quando o comentarista pediu que ele desse a sua versão para o fato de a torcida organizada do clube ter contratado o rapaz que lançou o sinalizador na Bolívia, causando a morte do menino Kevin Espada.
Mario Gobbi se enfureceu e disse não haver provas de que ele teria lançado o artefato e que “a prisão dos dez integrantes da Gaviões da Fiel em Oruro tinha sido um crime muito mais grave do que a morte do jovem boliviano”!
E então deitou falação sobre os procedimentos da lei boliviana, numa clara ingerência na soberania jurídica de um outro país, ao mesmo tempo em que dizia para os comentaristas boquiabertos que eles deveriam aprender sobre leis antes de interpelá-lo.
O show de grosseria e desvairamento terminou com a chamada dos comerciais.
Este é o perfil de muitos dirigentes do futebol brasileiro, que são despreparados para exercer a liturgia do cargo. O seu destempero muitas vezes açoda a desarmonia e estimula a violência.
A lista dos idiotas que estão no comando não é pequena, e neste exato instante ela tem entre os seus principais representantes o atual presidente do São Paulo, Carlos Miguel Aidar, que em pouquíssimo tempo só colecionou desafetos pela forma grosseira como conduz as discussões tanto interna quanto externamente, mas que diferentemente do presidente corintiano ainda está no início do mandato.
Já Mario Gobbi, que vai entregar o cargo neste mês de fevereiro, é o tipo de dirigente que nada acrescentou ao Corinthians nem ao futebol, e com certeza não vai deixar saudades.