quinta-feira, 28 de agosto de 2014






ARQUIBANCADAS VULNERÁVEIS

(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 28/08/2014)

É uma triste constatação, mas o brasileiro, tão cordato e amistoso, tão hospitaleiro e agradável, tão criativo e gentil, continua mostrando o seu lado negativo, em termos de comportamento.
O sujeito gosta de criticar os poderosos – que procedem criminosamente e não são punidos à altura por causa das brechas na lei, do compadrismo e da legislação em causa própria. Mas quando chega a sua vez, o mesmo sujeito deixa de fazer a sua parte.
Parece que as palavras “postura” e “honestidade” só servem para fazer engrossar as páginas dos dicionários e para apontar os deslizes dos outros. Para muita gente, o que vale geralmente é o “jeitinho brasileiro”.
Eu não estou me referindo àqueles que não respeitam filas nem vagas para deficientes ou idosos, nem àqueles que sujam a cidade, os que ficam com o troco a mais, ou os que levam a caneta Bic do escritório para uso do filho.
Como a minha praia é o futebol, estou me referindo à conduta do brasileiro como torcedor.
Longe de mim julgar os palavrões individuais ou o canto coletivo para ofender o torcedor adversário, o árbitro ou algum jogador. Afinal, a torcida contrária, mesmo também mesclada de garotos e senhoritas faz a mesma coisa, pois estamos, para o horror do vovô ou da vovó, vivendo “tempos modernos”.
É lamentável, no entanto, a prática de arremessar copos plásticos, chinelos e radinhos de pilha na direção de algum desafeto e a constante ameaça aos profissionais da imprensa.
É lamentável também notar que a moda agora é depredar cadeiras e sanitários dos estádios, mesmo quando o depredador torce pelo time da casa, que joga no seu estádio e vence o jogo!
Com a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo, a Fifa recomendou, entre outras coisas, que fossem reformadas ou construídas oito “arenas” (e fizeram doze) e que os torcedores fossem cadastrados para facilitar a sua identificação em caso de necessidade (o atraso nas obras e a preocupação voltada para outras prioridades deixou esta recomendação de lado).
Além disso, a fim de dar mais conforto e segurança para o torcedor, a Fifa limitou a lotação dos estádios, eliminou os fossos e os alambrados e solicitou que os organizadores colocassem assentos plásticos numerados e coloridos, como é de praxe nos principais estádios da Europa e dos Estados Unidos.
A lotação foi respeitada – mesmo com os ingressos falsos que inundaram as praças, possivelmente por causa do preço exorbitante – e o torcedor comum foi substituído por uma plateia com a aparência e comportamento de público de temporada lírica (apesar de terem insultado alto e bom som a presidente da República!).
Os fossos e os alambrados foram eliminados, ocorrendo apenas um pequeno incidente no jogo Estados Unidos x Bélgica, quando um espectador vindo de uma área destinada aos cadeirantes invadiu o gramado.
Quanto aos assentos, eles custaram entre 280 a 1.300 reais cada um e ao término da Copa estavam todos em perfeito estado de conservação. Bastou, porém, começar a temporada local e o torcedor habitual tomar conta das arquibancadas para que as partidas começassem a apresentar um saldo negativo que mistura falta de cuidado com falta de educação.
Cada partida nas arenas recém-inauguradas contabiliza a destruição de meia centena de cadeiras, graças à falta de carinho do torcedor pelo seu patrimônio.
A gente se pergunta se, quando está em casa vendo o jogo pela televisão, essa gente comemora os gols subindo nas cadeiras e poltronas ou se destrói seu mobiliário quando o jogo termina com a derrota do seu time de preferência.
Em artigos anteriores foram comentados muitos aspectos negativos que apequena o futebol brasileiro, e de certa forma tratamos o torcedor comum como vítima de um sistema perverso e dos “hooligans” das organizadas.
Parece, no entanto, que este torcedor comum não aprendeu ainda como fazer a parte que lhe cabe.       

 

 

segunda-feira, 25 de agosto de 2014






DECISÃO PRECIPITADA

 
(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 25/08/2014)


Já falamos sobre a nova convocação dos jogadores da seleção e demos uma pincelada rápida sobre as possibilidades de um sucesso imediato.
Mas tudo é irrelevante, pois depois do insucesso da Copa, a CBF deveria ter se recolhido para meditação e deixado o futebol de seleção rolar apenas nas categorias de baixo, visando a preparação dos jogadores olímpicos e tentando descobrir novos talentos, prontos para serem promovidos.
Afinal, para isso foi mantido o técnico e coordenador Alexandre Gallo.
Eu quero crer que os amistosos deste ano, principalmente contra Colômbia e Equador, sejam completamente inoportunos a esta altura dos acontecimentos, e quero crer também que a chamada de Dunga para comandar a seleção também tenha sido precipitada.
Tudo indica que a CBF ainda não entendeu bem o que está acontecendo. O presidente Marin deve acreditar que os 7x1 germânicos que nos tirou o sonho do hexa foi apenas um mero acaso, não levando em consideração nem o placar nem as especificidades técnicas e psicológicas que levaram a ele.
O problema é que Dunga e Felipão possuem basicamente o mesmo perfil: ambos primam pela disciplina e pelo amor à Pátria, cada qual do seu jeito.
Felipão busca seduzir os jogadores para que eles façam parte de uma grande família – a Família Scolari – onde a lealdade ao comandante e a subserviência tática devem ser o ponto nevrálgico para a consecução dos resultados positivos.
Antes de analisar o que e como o jogador pode render com um pouco de ousadia e iniciativa, ele analisa a capacidade do atleta em absorver a sua filosofia e seguir ordens. Assim, mesmo quando trabalha com jogadores especialistas em executar determinadas funções, Felipão impõe a eles um novo posicionamento e uma nova função, tornando a equipe burocrática e sem brilho.
Já Dunga prega o amor pela Pátria como se cada jogador adversário fosse um soldado inimigo, e comemora as vitórias como se ostentasse nas mãos a cabeça decapitada do oponente. Sua alegria se manifesta às avessas, pois enquanto outros agradecem aos céus, choram e riem de felicidade, ele grunhe xingamentos e exibe gestos de revolta...
O problema é que o desenho tático de ambos é o mesmo – uma defesa rebatedora, um time forte e fechado no meio do campo, e um definidor lá na frente para fazer aquele golzinho salvador. Por isso, não causou nenhuma estranheza que dos dez jogadores convocados por Dunga que haviam participado da Copa, cinco foram aqueles escalados por Felipão para fazer a marcação no meio do campo, isto é, o esquema limitado ao desarme – uma das causas da nossa falta de opções – deverá ser mantido.
Felipão não tinha um municiador que acertasse passes de meia distância, Dunga também não tem. Felipão não tinha um articulador e organizador de jogadas para facilitar a vida dos atacantes, Dunga também não tem. Felipão não tinha uma variação de jogadas que poderia confundir os adversários, Dunga também não terá, considerando os nomes convocados.
Corremos o risco de iniciarmos mal a jornada com o novo técnico e aumentar a desconfiança do mundo sobre a qualidade do nosso futebol.
Por isso, o mais prudente seria ter fechado a nossa seleção principal pra balanço. Aí, teríamos uma pausa para discutir, ponderar, analisar, descobrir novas opções de coordenador, técnico e jogadores, e só então tentar um caminho renovado, com os pés no chão.
Ao invés da nomeação de Gilmar Rinaldi, o ideal teria sido chamar uma comissão formada por pessoas de confiança – e Gilmar até poderia ser um deles – para observar a situação atual e as tendências do futebol brasileiro e do futebol mundial e, ao cabo de algum tempo apresentar um relatório que pudesse servir de base para a formação de uma nova comissão técnica com condições de alavancar o nosso futebol a partir do próximo ano.