sexta-feira, 30 de dezembro de 2016





Os primeiros dois versos se referem a uma música que eu denominei Mágoa de Verão, composta no início da década de 1960. Os dois outros versos correspondiam a outra música também feita na época, que não chegou a ter um título porque eu percebi que as duas partes se encaixavam perfeitamente tanto na melodia quanto na letra e acabei juntando as duas partes numa só. A música é uma bossa nova lenta.


MÁGOA DE VERÃO

Se dor fosse como a chuva
Que há em dia quente
Cai, passa depressa
Passa de repente
Mágoa de verão
Não passa logo, não

Se amor fosse como a folha
De árvore que chora
Cai devagarinho
Vento leva embora
Mas amor não vai
Fica no coração

Chove, a noite é fria
Chovem meus olhos também
Foge a paz que havia
Não pode haver mais ninguém
Não pode haver poesia
Não pode haver mais amor
Cadê aquela alegria?
Cadê? A chuva levou

Chove, a noite é quieta
Parece até procurar
Pela luz do dia
Pra esta tristeza acabar








Esta é a letra de uma das primeiras músicas que eu compus, acredito que em 1958, para uma namorada da época. A temática da música retratava as festinhas nas casas dos amigos que se transformavam em bailinhos regados a cuba-libres. Muito romantismo inocente no ar.  As músicas variavam de Ray Conniff a Sylvio Mazzucca e Perez Prado, com pitadas de Elvis, Bill Haley e Neil Sedaka.



PASSADO TÃO PRESENTE

Uma apresentação
Um aperto de mão
Uma rápida troca de olhar
“Vamos dançar?”
A eletrola fazendo girar o long-play
E seus sons espalhando no ar
Eu não sei
Se é Fulano & Sua Orquestra
Ou outro qualquer
Estou enfeitiçado
Por um rosto de mulher

Um abajur lá no canto
Tudo é meia luz
O ambiente de magia nos seduz
Mas a luz vem ferir nossos olhos com ardor
Alguém apertou
O comutador
Com um condão de fada
Eu faço a cena mudar
Nós dois dançando um fox
Nós dois e o luar
Passado tão presente
Que da mente não sai


sábado, 17 de dezembro de 2016



RESENHA DE FIM DE ANO

A Fifa colocou em prática a figura do “árbitro de vídeo”, um recurso que visa auxiliar eletronicamente a arbitragem sempre que aconteçam lances duvidosos que possam dar margem a diferentes interpretações.
Estava realmente na hora de se fazer os primeiros experimentos tecnológicos com a finalidade de prevenir erros de arbitragem grosseiros que infelizmente nos acostumamos a ver.
No entanto, talvez fosse mais prudente realizar o teste num jogo de menor importância, onde eventuais problemas na implantação não tivessem muita repercussão. Mas a Fifa resolveu testar a modificação numa partida de alcance mundial, na fase final do Mundial de Clubes disputado no Japão, expondo o “árbitro de vídeo” na sua primeira aparição a um certo fiasco, não por sua culpa digital, mas por culpa do árbitro de carne e osso que viu errado, interpretou errado e decidiu pior ainda.
Ele, o árbitro húngaro Viktor Kassai, assinalou um pênalti que pode até ter existido – a mim não me convenceu – mas foi precedido por um impedimento do atacante que sofreu a penalidade.
Em virtude dessa falha, o Atlético Nacional, da Colômbia, o novo time de todos os brasileiros, foi prejudicado numa partida em que vinha atuando bem, com chances de vencer, e acabou perdendo a oportunidade de disputar a partida final para o time da casa, o Kashima Antlers.
Ora, se o árbitro viu o lance no vídeo, constatou que houve a infração e que a mesma foi cometida dentro da área mas não viu o impedimento, para que serviu o “árbitro de vídeo”?
Eu sou plenamente favorável ao auxílio eletrônico nas arbitragens, mas este auxílio deve ser voltado para dúvidas específicas, como saber se a bola entrou no gol, se ela saiu pela lateral, se o jogador estava em posição de impedimento e outras que não sejam simplesmente objeto de interpretação. Lances de bola na mão ou mão na bola, por exemplo, dependem muito mais do que o árbitro pensa e de como ele viu o lance do que da constatação de se houve ou não o contato da mão com a bola.
O fato deve servir de estímulo para que árbitros sejam melhor orientados com respeito às regras e que a ajuda eletrônica não seja apenas mais um aplicativo a serviço da interpretação humana, mas que possa funcionar como um colegiado onde entre em discussão a validade e as características do lance.
A Fifa argumenta que o processo está sendo apenas iniciado e que medidas serão tomadas para orientar os árbitros a respeito do seu uso. Enquanto isso, os prejudicados vão continuar reclamando com o Papa.
Este torneio é o último capítulo do futebol em 2016.
Para os brasileiros o saldo em campo foi positivo. Saímos de uma vexatória e incômoda posição na tabela de classificação das Eliminatórias da Copa 2018 para a liderança do torneio, graças à tardia saída do técnico Dunga, a quem faltava tudo – conhecimento, postura e entendimento com os jogadores – e a chegada de Tite, que aliou o conhecimento técnico aprimorado nos últimos anos com uma postura educada e elegante e um trato mais humano com o grupo.
Outra notícia importante vem dos bastidores e mostra que boa parte dos clubes estão conseguindo deixar a crise pra lá e, administrando as finanças com pulso forte, dão mostras de uma boa recuperação, com boas perspectivas para 2017.
Se dentro do campo, entre vaias e aplausos, as coisas correram a contento, fora dele as brigas e a intolerância entre os torcedores continuaram a desafiar a lei e o bom senso.
Como destaque negativo supremo, perdemos toda uma equipe da Série A, a Chapecoense, num estúpido acidente provocado pela ganância e pela decisão equivocada do comandante da aeronave.
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Como acontece todos os anos, Gol de Placa entra num período de férias, coincidindo com a entressafra da mudança do calendário esportivo, desejando a todos os companheiros de O Imparcial, aos leitores e aos desportistas em geral um Feliz Natal e um Ano Novo pleno de saúde, paz e realizações.
Estaremos de volta na edição de 20 de janeiro de 2017. 



 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 16/12/2016)





sábado, 10 de dezembro de 2016






O GOL QUE PELÉ NÃO FEZ

Tudo corria dentro do script na partida final da Copa do Brasil. Vindo de uma vitória inconteste na casa do Atlético Mineiro na primeira partida, o Grêmio cozinhava o jogo ao seu feitio e ainda marcou o seu gol aos 43 minutos para garantir o título de vez.
Tudo continuou dentro do script e a torcida já comemorava  aos gritos de “é campeão!” quando o roteirista adicionou uma cena inesquecível que fez justiça à luta com que os mineiros se entregaram ao jogo: três minutos depois, já nos acréscimos, o equatoriano Juan Cazares empatou fazendo um gol antológico, que fez os mais velhos se lembrarem de um lance de 45 anos atrás.
Brasil e Tchecoslováquia disputavam a primeira partida pelo Grupo 3 em Guadalajara-México pela Copa do Mundo de 1970 e a partida estava empatada em um gol – o Brasil acabaria vencendo por 4x1 – quando diante de um público de 70 mil pessoas somente Pelé, que estava aquém da linha do grande círculo, viu que o goleiro tcheco Ivo Viktor estava adiantado. Pelé não teve dúvidas, e mandou um balaço a mais de 50 metros obrigando o goleiro a sair correndo em direção à meta para evitar o gol. Ele não alcançou a bola, mas ela não entrou, passando como se diz “raspando” a trave.
De volta ao presente, cumpre registrar que as emoções do jogo de Porto Alegre tiveram o dom de dar alegria ao público depois de uma semana de luto, quer esse luto fosse oficial quer fosse gerado pelo próprio sentimento dos atletas e desportistas.
A Copa do Brasil já foi e a Copa Sul-Americana não chegou a ter as partidas da fase final, embora tenha tido estádios cheios da mesma forma (eles tiveram lotação completa em Medellin na semana passada e em Curitiba nesta semana, com um público emocionado comparecendo para ver o gramado vazio de craques mas cheios de simbologia).
Neste final de semana acaba o ano esportivo brasileiro com a última rodada do Brasileirão, cujas posições já estão praticamente consolidadas, restando saber quem será o vice-campeão e qual será o último rebaixado.
A posição de vice-campeão, disputada entre Santos e Flamengo, é praticamente simbólica, embora valha também algum dinheiro. O rebaixamento não é simbólico, e três clubes – Internacional, Sport e Vitória – lutam para não ser o escolhido.
Ao Vitória, que joga em casa, basta um empate contra o Palmeiras. O Sport, também jogando em casa, precisa apenas de um empate contra o Figueirense, pois seu saldo de gols marcados mostra um placar de 55x40 contra o seu mais direto perseguidor, o Inter.
Ao Internacional cabe a parte delicada da história.
Clube grande, sem nunca ter sido rebaixado, não depende das suas forças a não ser que vença o Fluminense no Rio de Janeiro tirando o saldo de 15 gols negativos que tem para o Sport – isso se o Sport não vencer.
O Campeonato Brasileiro deste ano está dando panos pra manga.
Esta semana já tivemos mostra da pequenez do presidente do Internacional Vitório Piffero e dos dirigentes que ingressaram com uma ação para que o Vitória perca os pontos das partidas em que o zagueiro Victor Ramos atuou, embora a CBF e a Fifa afirmem que está tudo legal.
Postura bem diferente do novo presidente da Chapecoense, Ivan Pozzo, que opinou contrariamente a qualquer manobra que desse ao clube imunidade contra o rebaixamento nos próximos três anos, como sugeriram alguns dirigentes de outros clubes. Pozzo disse que no futebol “se ganha e se perde” e que os resultados têm que ser alcançados no campo, marcando com isso um golaço digno de Juan Cazares.    
Enquanto Pozzo demonstra ser um verdadeiro desportista, Piffero mostra a mesquinhez de quem não merece ocupar o cargo que ocupa. Piffero é pífio, e eu sinceramente torço para o Inter cair por causa dele.

 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 09/12/2016)






sábado, 3 de dezembro de 2016





A HORA DO RECOMEÇO

A imprensa e a opinião pública já disseram tudo o que tinha que ser dito a respeito da tragédia aérea nos arredores de Medellin, portanto não vou descer a detalhes.
A única coisa que eu posso acrescentar é estritamente pessoal, pois diz respeito não a análises técnicas ou esotéricas, mas ao meu próprio sentimento, ligado que sou às coisas da bola.
Ao executar um trabalho voltado para o esporte – em particular ao futebol – o comentarista se habitua a frequentar um meio do qual ele fisicamente não faz parte, mas cria intimidades.
E, ao acompanhar os jogos, ouvir entrevistas, se imiscuir no dia a dia das equipes e participar da efervescência que cerca as partidas antes, durante e depois da sua realização, além de discutir consigo mesmo ou com uma pessoa próxima o que está sendo dito numa mesa redonda, o comentarista se torna amigo dos profissionais do esporte, sejam eles jogadores, membros da comissão técnica ou jornalistas que fazem a cobertura dos clubes ou dos eventos.
Assim, com a queda do avião da LAMIA, perdi diversos amigos que participavam comigo, sem que soubessem, de incontáveis horas de lazer.
Isso acontece com o espectador de novelas, com o cinéfilo ou com o tiete de cantores famosos. A pessoa se sente próxima do artista como se ele fosse seu amigo particular ou parente próximo. 
Isso explica a comoção que sentimos quando uma tragédia ocorre na nossa proximiidade, seja esta proximidade física ou emocional, pois percebemos que a catástrofe está ao nosso redor e que quem quer que reja o nosso destino coloca o perigo num patamar imponderável a poucos passos da gente. Aí ficamos sobressaltados como uma barata com as antenas ligadas, sentindo o perigo que ronda por perto, pois como dizia Billy Blanco, “a bruxa, que é cega”, esbarra na gente e a vida estanca”.
É claro que nos é igualmente pesaroso um acidente aéreo que mate toda uma delegação de rúgbi da Nova Zelândia ou de ginástica artística da China, mas nestes casos nós aqui, no Brasil, digerimos o pesar de uma forma mais tranquila, pois estamos longe das lágrimas do povo e da comoção causada.
Mas no caso da Chapecoense, ver o fim de uma equipe da Série A, muitas vezes mostrada nas quartas-feiras ou nos domingos na tela da nossa televisão, representa para os brasileiros um choque doloroso.
Já nos habituáramos a ver os jogadores da Chapecoense mostrando técnica e brio e já estávamos cientes do poderio daquele time, vencesse ou não a final da Copa Sul-Americana. Afinal, seus jogadores estiveram o ano todo numa posição de destaque, e muitos deles já estavam nos planos de outros grandes clubes para reforçar o elenco em 2017.
Para uma equipe considerada pequena, a Chape até que faz uma boa campanha no Campeonato Brasileiro: faltando uma rodada está entre os dez primeiros colocados – em nono, no caso – e obteve resultados importantes como vencer Botafogo e Fluminense no Rio de Janeiro, acumular vitórias em casa contra São Paulo, Internacional, Botafogo e Cruzeiro e empatar com Flamengo, São Paulo e Cruzeiro no campo dos adversários.
Chegou à semifinal da Copa do Brasil, sendo eliminado no detalhe pelo Atlético Mineiro e foi o único time brasileiro que chegou este ano à final de um torneio intercontinental – a Copa Sul-Americana – final que infelizmente não chegou a disputar.
É hora de recomeço. Com a ajuda de todos, a Chape tem que sobreviver à tragédia e tocar a bola pra frente. Não esqueçam que para encerrar a temporada o time ainda tem que cumprir uma partida contra o Atlético Mineiro pelo Brasileirão 2016, jogando em casa, na Arena Condá.
Os sobreviventes vão à luta.  


(Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 02/12/2016)





sábado, 26 de novembro de 2016





A CRIATIVIDADE BRASILEIRA

Na edição de domingo passado O Imparcial publicou na sua Página Três uma interessante matéria sobre invenções brasileiras. Vou mencioná-las novamente aqui, levando em conta que vale a pena refrescar a memória do leitor para as coisas boas num mundo infelizmente infestado de notícias ruins que o jornalismo tem, por missão, a obrigação de divulgar.
Além do mais, após a publicação impressa, Gol de Placa também alimenta meu Facebook e meu blog pessoal, onde tenho diariamente eventuais visitantes virtuais que não são necessariamente leitores do jornal.
A principal maravilha brasileira é o avião de Santos Dumont, cuja paternidade é também reclamada pelos países de língua inglesa, que proclamam os Irmãos Wright como autores da façanha.
Além do aeroplano 14-Bis, outras criações brasileiras ganharam o mundo, eventualmente com uma ou outra ressalva de algum estrangeiro despeitado.
O primeiro balão tripulado (pomposamente chamado de aeróstato) foi a Passarola do padre Bartolomeu de Gusmão. Também levam a assinatura verde-amarela o delicioso doce brigadeiro, de autoria de um confeiteiro desconhecido teve sua receita batizada em homenagem ao brigadeiro Eduardo Gomes, político-militar dos anos 1950,  e o prosaico escorredor de arroz, inventado pela cirurgiã-dentista Therezinha Zorowich. Adicionem-se a estes inventos a máquina de escrever com os seus complicados dispositivos mecânicos (padre Francisco João de Azevedo) e o orelhão (Chu Ming Silveira), atualmente em fase de extinção, além do identificador de chamadas telefônicas – o  bina – (Nélio Nicolai) e a obra prima do engenheiro Aron de Andrade, o coração artificial.
Por último, uma invenção que daria muito que falar, a urna eletrônica, atribuída a um desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina chamado Carlos Prudêncio, datada de 1989.   
Os estádios esportivos também receberam a sua contribuição com a invenção do painel eletrônico patenteada em 1996 pelo cearense Carlos Eduardo Lamboglia.
Apesar de seguir de forma ortodoxa um regulamento que foi criado em 1863, o futebol tem também as suas “invenções” ao longo do tempo, quer por adaptações aos tempos modernos quer por necessidade de aperfeiçoar a didática e a nomenclatura.
Mas aí os brasileiros nem sempre entram com o mérito da invenção.
Hoje tomei conhecimento que o reverente minuto de silêncio imposto pela arbitragem quando do falecimento de algum esportista de renome ou de alguma tragédia coletiva de alta comoção pública foi obra de parlamentares portugueses para prestar uma homenagem póstuma ao brasileiro Barão do Rio Branco (José Maria da Silva Paranhos Júnior).  
Apesar do “gol olímpico” (cobrança direta de um escanteio onde a bola entra no gol sem a participação de nenhum outro jogador), ter nascido na Escócia, tendo como registro histórico da sua autoria o escocês Billy Alston em agosto de 1924, o lance foi batizado como tal num jogo amistoso entre as seleções da Argentina e do Uruguai em  outubro do mesmo ano, no gol anotado pelo argentino Cesáreo Onzari (a Argentina ganhou por 2x1). O nome não teve a intenção de homenagear ninguém, mas sim de ironizar a seleção uruguaia, denominada Seleção Olímpica por ter se sagrado campeã olímpica no mesmo ano em Paris.
Assim como acontece com o avião (e a máquina de escrever), existem muitos candidatos a serem o inventor da “bicicleta”. O brasileiros afirmam que foi Leônidas da Silva, useiro e vezeiro em praticar a jogada, mas os chilenos consideram Ramón Unzaga como o inventor do lance. Para os argentinos e italianos, Luis Indaco e Carlo Parola são respectivamente indicados como os precursores da jogada.   
A “paradinha”, lance em que o atacante atrasa a cobrança do pênalti para obter vantagem sobre o goleiro, já foi autorizada e proibida algumas vezes. Atualmente sua validade depende da interpretação do árbitro. Seu inventor teria sido Pelé, que a utilizou pela primeira vez num amistoso em 1962 contra o River Plate. O lance foi anulado pelo árbitro. O próprio Pelé, no entanto, afirma que ele apenas copiou um lance do comediante Chaves (Roberto Gómez Bolaños), que tinha Quico como goleiro.
Quanto à “cavadinha”, pênalti batido com efeito mandando a bola sem força por cima do goleiro, o inventor seria, por unanimidade, o jogador tcheco Antonin Panenka, em 1976. Mas como Nélson Rodrigues afirmava que “toda unanimidade é burra”, fica valendo uma pesquisa mais apurada...
Por fim, o “gandula” aquele que repõe a bola em jogo com maior ou menor rapidez dependendo do time que está ganhando parece ter o seu nome derivado de um jogador argentino que jogava pelo Vasco em 1939 chamado Bernardo Gandullo, que tinha como hábito correr atrás da pelota quando ela saía do campo de jogo para não retardar o reinício da partida. Há controvérsias.

 (Artigo publicado no caderno de esportes do jornal O Imparcial de 25/11/2016)


domingo, 20 de novembro de 2016





OS ENCANTOS DO ESPORTE A MOTOR

Fugindo às suas características de dar palpites sobre o mundo da bola, Gol de Placa desta sexta-feira vai abordar um assunto que entre os brasileiros se tornou extremamente polêmico. Estou de referindo à Fórmula 1.
“Por que polêmico?” – perguntarão os leitores.
Porque, respondo eu, desde a morte de Ayrton Senna, poucos se interessam em dedicar as manhãs e madrugadas de domingo a ouvir o ronco dos motores, como dizem os locutores especializados.
Talvez falte motivação a esses brasileiros, mas não falta tradição nem história nas corridas automobilísticas, pois desde 1902 os motores roncavam no Hipódromo Paulistano em São Paulo. Durante a primeira década do século 20 outras corridas se realizaram por aqui, mas o esporte se tornou definitivo a partir de 1933 com as corridas no Rio de Janeiro no Hipódromo da Gávea.
A profissionalização de fato aconteceu com o piloto Manuel de Teffé, que veio da Europa com o sonho de organizar as provas automobilísticas no Brasil, o que propiciou o surgimento de pilotos como Irineu Corrêa e Francisco Landi.
O circuito de Fórmula 1 começou  suas aventuras em 1950 em Silverstone, na Inglaterra, tendo como grande nome o argentino Juan Manuel Fangio, cinco vezes campeão e duas vezes vice em oito temporadas.
Foi apenas em 1970, em Brands Hatch, também na Inglaterra,  com a estreia de Emerson Fittipaldi, que o Brasil teve um piloto fazendo parte do chamado circo. Ele seria bicampeão em 1972 e 1974 e saiu da categoria após uma fracassada tentativa de fazer andar nas velozes pistas do mundo um carro de fabricação brasileira, de marca Copersucar, mas foi fazer sucesso na Fórmula Indy.
Foi quando a imprensa esportiva brasileira – radio e televisão – começou a transmitir os Grandes Prêmios, com audiência e patrocinadores garantidos, fazendo surgir uma geração de entusiastas que eram ao mesmo tempo mecânicos, pilotos e inovadores, geração que produziria José Carlos Pace,  Maurício Gugelmin, Roberto Pupo Moreno e outros.
A segunda leva de pilotos brasileiros bem sucedidos teve a participação de Nelson Piquet, que conquistou três títulos, em 1981, 1983 s 1987, e também mereceu os holofotes.
Mas foi a terceira leva, com a chegada de Ayrton Senna, que criou toda uma equipe de fãs, levando ao delírio das manhãs de domingo desde aqueles que realmente se identificavam com o automobilismo até aqueles que não tinham a mínima intimidade com o esporte e até relutavam em chamar de esporte aquele conjunto formado por homem e máquina.
Ayrton Senna foi tricampeão em 1988, 1990 e 1991, foi vice em 1993, e deixou a sensação que poderia ter ido além não fosse o acidente fatal de 1994 em Imola, na Itália.
Senna representa uma história à parte para o automobilismo, não apenas no Brasil como também no resto do mundo. Estreou em 1983 e, de acordo com muitos especialistas deixou um legado de conquistas e elevou o nível do esporte a outro patamar. Após mais de vinte anos, pesquisas mostram que o piloto é ainda considerado o melhor de todos os tempos.
A sua ausência causou uma grande baixa entre os telespectadores não apenas porque não apareceram pilotos com o carisma necessário para substituir a sua imagem, mas também porque brasileiro é um torcedor que “não gosta de esporte, ele gosta de vencer”. Mas a falta de um piloto brasileiro competitivo não me impede de admirar outros talentos que fazem do esporte um dos mais considerados no mundo em termos de mídia, torcida e injeção de dinheiro envolvido.
Depois de Senna, a Fórmula 1 mostrou Michael Schumacher (heptacampeão), Sebastian Vettel (tetracampeão) e Lewis Hamilton (tricampeão), sem falar dos bicampeões Fernando Alonso e Mika Hakkinen, todos pilotos de alto nível que sem dúvida também valeram a pena minha atenção nas temporadas automobilísticas de 1994 para cá.
Domingo passado eu tive a oportunidade de rever Senna no carro e na alma do holandês Max Verstappen, que nas voltas finais fez treze ultrapassagens debaixo de intensa chuva, ganhando treze posições e saindo de um décimo-sexto lugar para o pódio.
Então, vale ou não vale a pena continuar prestigiando a Fórmula 1?     


 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 18/11/2016)




sábado, 12 de novembro de 2016






BRASIL X ARGENTINA

Quando você estiver lendo O Imparcial desta sexta-feira já estará sabendo o resultado do jogo Brasil x Argentina que aconteceu ontem à noite no Mineirão, após o fechamento da nossa página de esportes.
O Brasil de cara nova atuava como favorito diante de um adversário que estava deixando a desejar nas últimas partidas e que precisava desesperadamente se recuperar, pois corre o risco de não estar presente na lista dos disputantes à Copa do Mundo da Rússia em 2018.
Protagonistas de um dos maiores clássicos do futebol mundial, comparado por exemplo na Europa a um Itália x Alemanha, Brasil e Argentina se enfrentam oficialmente há 102 anos, ou seja, a partir de 1914.
Entre 1908 e 1914 foi realizada uma série de 13 jogos entre combinados brasileiros (com jogadores paulistas ou cariocas) e argentinos, sem o caráter de seleção nacional. Neste período houve 13 jogos com 10 vitórias dos argentinos, 2 dos brasileiros e um empate. No placar, uma verdadeira lavada – 43 x 13 para a Argentina. Mas isto está fora dos números oficiais, pois aconteceu na época do amadorismo.
A partir de 1914 as duas federações começaram a considerar os confrontos como oficiais.
A primeira partida que entra para a estatística foi realizada em 20 de setembro no estádio do Club Gimnasia y Esgrima, em Buenos Aires, a Argentina triunfou por 3x0. Uma semana depois, no mesmo local, o Brasil deu o troco – 1x0.
Até o jogo de ontem haviam sido 102 jogos realizados entre amistosos e disputas de torneios (Copa Rocca, Campeonato Sul-Americano, Copa América, Taça Roberto Cherry, Taça Confraternidad, Campeonato Pan-Americano, Taça do Atlântico, Taça das Nações, Eliminatórias para a Copa do Mundo, Copa do Mundo, Mundialito, Torneio Bicentenário da Austrália, Jogos Olímpicos, Copa das Confederações e Superclássico das Américas) em 101 anos, desde setembro de 1914 até novembro de 2015.
Nesta contabilidade o Brasil leva uma ligeira vantagem, com 41 vitórias contra 36 dos platinos. Foram computados 25 empates. Quanto à artilharia, os  argentinos marcaram 167 gols contra 153 dos brasileiros. A maior goleada corresponde a um 6x1 para a Argentina e, março de 1940 pela Copa Rocca, no Estádio Gasômetro de Boedo, em Buenos Aires. O Brasil respondeu com um 6x2 também pala Copa Rocca em dezembro de 1945 no Estádio de São Januário, no Rio de Janeiro.
Falando de títulos, a Argentina leva vantagem na conquista da Copa América (14 vezes contra 8 do Brasil) e nas Olimpíadas, com 2 medalhas de ouro (o Brasil tem apenas uma). No entanto, o Brasil venceu 5 vezes a Copa do Mundo e 4 vezes a Copa das Confederações (a Argentina foi campeã do mundo 2 vezes a apenas uma vez faturou a Copa das Confederações).
A Copa Rocca, disputada apenas  pelos dois países em 15 edições, tem o Brasil como o grande vencedor, com 11 títulos contra só 4 dos nossos hermanos. O torneio, que havia sido descontinuado em 1976 voltou em 2011 com o nome de Superclássico das Américas ou Copa Dr. Nicolas Leoz.
A estatística favorecia os argentinos com uma larga margem de vitórias e gols sobre o Brasil até 1970, quando os brasileiros reagiram e partiram para o equilíbrio, conseguidos graças a uma invencibilidade de 13 jogos que durou até 1982.
O torcedor brasileiro costuma dizer que detesta a Argentina, apesar de os analistas confessarem que sempre foram atraídos pelo futebol altamente técnico e ao mesmo tempo raçudo dos seus jogadores. Já os argentinos, confessadamente, apreciam sem ressalvas o futebol malandro e cheio de fintas dos brasileiros.
Muitos argentinos brilharam no futebol brasileiro, entre os quais podemos citar Doval (Flamengo e Fluminense). Tevez (Corinthians), Andrada (Vasco), Sorin (Cruzeiro), Fillol (Flamengo) e Ramos Delgado (Santos). A lista dos brasileiros que atuaram na Argentina, é menos extensa, mas não menos importante. Nela estão Domingos da Guia, Heleno de Freitas e Paulo Valentim (Boca Juniors) e Silas (San Lorenzo).        




 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 11/11/2016)






sexta-feira, 4 de novembro de 2016





OS FANTASMAS DO ITAQUERÃO

Em plena semana de Halloween e de Finados, o Corinthians foi abalado por mais uma aterradora notícia: uma infiltração encontrada no Itaquerão está provocando o vazamento de 10 milhões de litros de água e poderá ocasionar um deslizamento de terra avassalador, atentando contra a segurança de muita gente, entre torcedores e ocasionais passantes.
De acordo com o laudo, o deslizamento poderá atingir uma área de estacionamento que comporta 350 carros e fica literalmente tomada nos dias de jogo. Pior: a vazante pode passar do estacionamento para a Radial Leste, via expressa que margeia o estádio onde circulam milhares de carros diariamente.
Se a tragédia ocorrer durante a realização de uma partida do clube ela será muito grande, com perdas materiais e humanas na área do estádio e da via expressa.
Fatos como este dão um atestado se ineficiência de toda uma equipe de técnicos e engenheiros, e deixam mais ou menos patente que não houve um planejamento adequado e que provavelmente a técnica e os materiais utilizados fogem às normas e aos manuais.
As bruxas estão soltas, e não é de hoje.
Antes de ser iniciada a terraplenagem, descobriu-se que o local escolhido para a construção era uma região de oleodutos subterrâneos pertencentes a uma subsidiária da Petrobrás, o que encareceu terrivelmente os serviços, pois além da retirada dos dutos houve necessidade de um tratamento especial no solo para prevenir futuras explosões que poderiam ser causadas por gases retidos no subsolo.
No entanto, dinheiro parece não ter sido problema. A Construtora Odebrecht, responsável pela obra, assumiu todos os custos junto à Caixa Econômica Federal, uma atitude nunca vista num contrato comercial, ficando a empreiteira se encarregada das despesas para resolver a compensação financeira somente ao final da obra.
Isto deixou na época muita gente com a pulga atrás da orelha, mas hoje em dia tudo parece muito natural e bem explicado, levando-se em conta todos os escândalos em que se envolveram a Odebrecht, os diretores da Petrobrás e os administradores do país, hoje escancarados ao público.
Mas isso não para por aí.
Sabe-se que a obra custou um bilhão e duzentos milhões  de reais (um bilhão e seiscentos se forem incluídas as despesas financeiras) quando poderia ter custado quase 40% menos, o que se explica pelo superfaturamento dessa construtora que pavimentou o relacionamento com o poder num “toma lá-dá cá” sem precedentes na história da República.
Com a diretoria na cadeia, a Odebrecht está abrindo o bico e os tentáculos das suas declarações começam a atingir políticos e dirigentes esportivos que estariam mancomunados com a fraude.
Apesar do preço exagerado, o estádio não apresenta qualidade. Apresenta sim diversas falhas estruturais que incluem  o risco do deslizamento, a queda de meia tonelada de material do teto, partes com constante alagamento, vazamento de água na área das lanchonetes, danos na pintura e a abertura de buracos de grandes proporções no local de entrada dos torcedores.
Durante a construção, um enorme guindaste caiu matando dois operários e danificando toda uma lateral e parte da cobertura que tiveram que ser refeitas.
Problemas técnicos à parte, o clube se vê às voltas com o um débito de 310 milhões tendo a Caixa Econômica como avalista. O clube precisa quitar a dívida até 2028 em astronômicas parcelas de 5,3 milhões de reais por mês, o que a torna impagável sem a participação de um parceiro externo para injetar dinheiro e usar o seu nome no estádio, com vantagens a ser estudadas (o chamado “naming rights”).
O estranho nisso tudo é que a Odebrecht faturou com a fraude, o governo da época faturou com o prestígio de dar ao clube um estádio que seria usado na Copa do Mundo (ganhando com isso os votos e a simpatia da torcida corintiana), e os partidos políticos regados com parte do dinheiro fraudado revigoraram as suas campanhas e elegeram seus candidatos pelos quatro cantos do país.
Assim, todo mundo ganhou, menos o clube, que serviu de escada para ações inescrupulosas sob o aplauso dos seus dirigentes.
Foi uma vitória de Pirro, porque os Odebrecht estão na cadeia, os governantes da época estão indiciados em vários processos, os partidos que se prevaleceram estão naufragando e o próprio estádio está ruindo e na eminência de ser tomado pela Caixa Econômica por conta das prestações não pagas.    
   



(Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 04/11/2016)





quarta-feira, 2 de novembro de 2016





O Choro Negro de Paulinho

Sempre achei o choro-canção “Choro Negro”, de autoria de Paulinho da Viola, uma obra prima do cancioneiro brasileiro. A melodia e a harmonia possuem aquilo que se chama de pureza estética, e a sua beleza comovente me obrigou a procurar por todas as suas gravações para afinal concluir que as gravações desta música são poucas e que a letra era inexistente.
Conversa vai, pesquisa vem, ao ouvir uma declaração de Sérgio Cabral, descobri que Paulinho pertence à longa linhagem de chorões que consideram que o verdadeiro choro deve ser exclusivamente instrumental.
Sérgio Cabral teria ido à casa de Paulinho com uma letra feita para um choro composto por ele – ele, Paulinho – e antes de mostrar a preciosidade ouviu uma peroração a respeito da falta de sensibilidade de alguns compositores que insistem em colocar palavras nas notas plangentes de um choro-canção, também referido como valsa-choro ou varandão.
“Isto é um crime”, – continuou Paulinho – “é o mesmo que você colocar letra numa valsa de Chopin!”
Cabral depressa mudou de assunto sem sequer tê-lo iniciado, deixou a sua poesia jazer desanimada no bolso traseiro da calça, conduzindo a conversa por outras praias menos dolorosas, e desta forma aprendeu a lição.
Há alguns anos – em 2008, precisamente - insensível às lamentações de Sérgio Cabral, eu resolvi escrever uma letra para o samba-choro de Paulinho, totalmente à sua revelia.
Bem, não exatamente à sua revelia, porque usei todas as formas de comunicação possíveis na época, incluindo mensagem eletrônica e telefonemas à procura do seu agente, para pedir sua permissão a fim de que eu pudesse escrever uma letra que se adequasse ao clima da música.
Como não obtive resposta fui em frente e compus a letra da música, a qual transcrevo abaixo na esperança que os músicos maranhenses da MPB possam eventualmente incluí-la no seu repertório nas nossas tertúlias musicais.
O tema versa sobre um artista que se prepara para adentrar o palco e enfrentar o público. Ele faz isso diariamente, mas o sentimento de emoção, medo e insegurança é sempre o mesmo.
Podem cantar, se por acaso o Paulinho reclamar, eu resolvo.

Obs: eu canto esta música em si bemol.    

                                   
                               CHORO NEGRO     

Há quanto tempo
Este momento eu esperei
Mas gostaria de fugir
E o porquê não sei
O camarim guarda o silêncio
Que antecede o show
Lá fora vozes sussurrando
Sob a luz em meio tom

Olho no espelho
Que reflete o que há em mim
Eu gostaria de sentir
Felicidade, enfim
Escolho a face que usarei
Para enfrentar
Esta plateia colorida
Que me assusta e faz chorar

Na solidão deste monólogo cruel
Sinto na boca um gosto fel
E o coração parece então acelerar
Sigo em silêncio
Em direção ao meu destino
Caminho ao som de um violino
Que me empurra para o palco
E as cortinas de veludo
Ao descerrarem mostram tudo
Rosas vermelhas no cenário
E aplausos quentes como a luz
A emoção me faz chorar
Um choro negro
Que faz parte deste enredo
Que fascina e me seduz










domingo, 30 de outubro de 2016





A LEI, ORA, A LEI

Tenho muitos amigos advogados, outros tantos amigos juízes, e também promotores e professores de direito, e com certeza serei alertado para alguma incorreção que estarei incorrendo. Aceitarei de bom grado qualquer esclarecimento que me seja prestado a fim de clarear as minhas ideias e corrigir o meu rumo, posto que não sou um especialista no assunto.
Mas, por não ser especialista no assunto, falo a língua do cidadão que assim como eu se pergunta o motivo para tanto desrespeito às leis.
Falta de educação, dirão alguns. Falta de noções de ética, dirão outros. Faz parte da nossa cultura, retrucarão terceiros. Falta orientação familiar e escolar, concluirão os mais precavidos.
Qualquer que seja porém o motivo, a gente fica com a sensação de que faltam na verdade autoridade e responsabilidade em se fazer cumprir a lei num país onde as leis não são levadas a sério por aqueles que cuidam das leis e muito menos por quem as descumpre.
Existem 181 mil leis na Constituição brasileira que foram redigidas para serem cumpridas, mas muitas delas, quer por absoluta inobservância ou impunidade, quer por total falta de coerência, quer pelas centenas de brechas que oferecem para o jurista arguto ou quer pela natureza da infração e do infrator, passam batidas e oferecem pouco risco a quem atenta contra elas.
A Constituição atual data de 1988 e foi escrita debaixo de uma necessidade premente de fazer retornar aos cidadãos os direitos que haviam desaparecido por causa de um estado de exceção que durou vinte anos. É, portanto, na velocidade imprimida na História do Brasil nos últimos vinte e oito anos, uma Carta Magna desatualizada.
Por causa disso, ela acabou sendo justa e correta para a época em que foi feita, mas foi se tornando leniente e defasada com o passar do tempo.
Este é o problema de uma Constituição com excesso de leis, artigos e parágrafos: quis ser muito precisa e detalhada e acabou sujeita a diferentes interpretações. Uma Constituição enxuta, com leis em que prevalecessem o bom senso e uma forte noção de direito talvez oferecesse ao cidadão mais segurança e menos incertezas.
Mas, a que vem tudo isso, pergunta o leitor acostumado a ler críticas sobre a convocação da seleção, o gol indevidamente anulado, os problemas do futebol brasileiro e uma ou outra incursão no passado de algum ídolo do esporte?
É que, mais uma vez tivemos que assistir a cenas deploráveis de torcedores e policiais se espancando numa tarde festiva em plena reabertura do Maracanã, num clássico entre os clubes de maior torcida do Brasil.
Diz a música de Francis Hime “Maracanã da festa popular, domingo é lá que a poesia vai rolar”, mas o que rolou foi muita pancada.
Depois da borracha cantar e da calmaria voltar, 42 torcedores corintianos foram presos (desta vez os rubro-negros não brigaram com ninguém) e levados para a delegacia para averiguação e confrontação das fichas policiais. Deles, 11 foram liberados e 31 conduzidos preventivamente ao presídio de Bangu.
Poderia jurar que alguns deles são os mesmos da morte do menino em Oruro, são os mesmos do quebra-quebra no Metrô de São Paulo, são os mesmos de outras tantas confusões permeadas por extrema violência. Ou então, se os baderneiros forem outros, é sinal que o mau exemplo está se propagando assustadoramente por falta de providências mais enérgicas.
Os briguentos foram fichados e serão fatalmente liberados, e o STJD (para ficarmos apenas no âmbito esportivo) simplesmente emitiu uma declaração lacônica proibindo a presença deles nos jogos do Corinthians até o final do Campeonato Brasileiro e – mais uma vez – banindo a torcida organizada Gaviões da Fiel dos estádios de futebol.
Só não diz como esta sentença será operacionalizada.
A Inglaterra padecia do mesmo mal, mas hoje não se notam resquícios de violência nos estádios porque as penalidades, principalmente para um torcedor apaixonado, são rigorosas. Lá, torcedores são banidos dos estádios por infrações bem menos graves do que esta do último domingo no Maracanã.
-0-
Vejam só, eu deveria estar prestando uma homenagem a Carlos Alberto Torres, um dos maiores jogadores do futebol brasileiro, ídolo do Fluminense, do Santos, do Botafogo, do Flamengo e da Seleção Brasileira, morto nesta última terça-feira, e estou gastando meu português com três dúzias de delinquentes que não valem uma clicada.     



 (Artigo publicado no caderno de esportes do jornal O Imparcial de 28/10/2016)


sábado, 22 de outubro de 2016






A VOLTA DO ASTERISCO

A Série A do Campeonato Brasileiro volta a ter um asterisco na tábua de classificação, indicando que uma partida foi encerrada sem que se atribuíssem pontos aos litigantes. Isto não acontecia desde 2013, quando a Portuguesa foi rebaixada pelo Tribunal (no campo cairia o Fluminense).
O clássico Fla-Flu está considerado sub-judice pelo STJD, que analisa a possibilidade da realização de uma nova partida por causa de um alegado erro de direito cometido pelo árbitro Sandro Meira Ricci. No placar, o Flamengo venceu por 2x1.
Tudo porque Meira Ricci validou um gol tricolor denunciado como irregular pelo seu assistente e depois de longos 13 minutos voltou atrás e concordou que o bandeirinha estava certo, mas só após ter sido alertado por uma pessoa alheia à arbitragem, o que não é permitido pelas regras da Fifa.
Não importa na verdade se houve ou não impedimento (parece que houve), pois um erro de arbitragem é tolerado pelas regras por se tratar de um “erro de fato”. O que não pode é haver o tal “erro de direito”, como um time jogar com doze jogadores, por exemplo, e entre as proibições está a chamada “ajuda externa da arbitragem”, que foi exatamente o que aconteceu.
De qualquer forma, mais uma vez o tribunal tem que se intrometer para modificar um resultado obtido no campo, o que, pelas características do jogo, tendo ou não havido o impedimento, termina por frustrar torcedores e jogadores.
Meira Ricci tem colecionado erros grosseiros e continua incompreensivelmente prestigiado pela CBF. Seu erro de agora foi além de tudo covarde porque ele não teve coragem de usar a verdade ao redigir a súmula.
A atuação dos árbitros nas mais recentes rodadas do Campeonato Brasileiro tem beirado a calamidade, tanto por problemas de visão como por erros de interpretação.
Alguns árbitros, mesmo muito bem colocados e próximos ao lance simplesmente não conseguem ver toques de mão na bola ou pênaltis claríssimos ou veem irregularidades em lances normais; por outro lado, a falta de critério e a falta de diálogo entre o árbitro e os seus assistentes continuam gerando situações contraditórias que acabam deixando todo mundo descontente.
Se isto não envolvesse diretamente os quatro primeiros colocados talvez não fosse tão flagrantemente notado, posto que estes erros vêm infelizmente se constituindo num fato corriqueiro no nosso futebol. A arbitragem brasileira é cronicamente péssima e parece que não há jeito de ser consertada.
Assim, palmeirenses, flamenguistas, atleticanos e santistas estão pondo a boca no trombone e se acusando uns aos outros de estarem sendo beneficiados, e os presidentes destas agremiações têm vindo a público desfiar as suas teorias da conspiração.
Alguns pedem a anulação de partidas, outros pedem que determinados árbitros não sejam mais escalados, outros suspeitam de que resultados tenham sido armados na Comissão de Arbitragem, mas todos se esquecem que ao longo destas trinta e uma rodadas já disputadas eles também já tiveram uma mãozinha da arbitragem em seu benefício.
Em outros países, quando investigadas com rigor, situações como estas geraram sérias consequências que inclusive levaram muita gente pra cadeia pela constatação de que resultados eram fabricados por esquemas que incluíam o envolvimento de loterias e outros babados.
Tudo leva a crer que o que acontece no Brasil não chegue a tanto, mas nada impede que seja levada adiante uma investigação séria e que seja feito um processo de capacitação rigoroso para que a Comissão de Arbitragem se certifique da competência de cada um dos seus representantes.
Foi por causa da falta dessa competência que Meira Ricci, um árbitro useiro e vezeiro em criar problemas nas partidas em que apita, leva o Campeonato Brasileiro a este infeliz impasse bem no momento em que recrudescia a luta entre Palmeiras e Flamengo pela liderança.
Por causa disso, o campeonato corre o risco de se transformar numa novela cheia de recursos jurídicos e talvez possa encerrar o ano sem um campeão dentro do campo.
Há exatos onze anos, o Campeonato de 2005 foi conturbado por denúncias contra o árbitro Edilson Pereira de Carvalho que, pressionado, declarou ter recebido dinheiro para fabricar certos resultados. Por esse motivo o STJD cancelou diversas partidas, invertendo profundamente a pontuação da tabela e desequilibrando o certame, que culminou dando o título ao Corinthians.
O engraçado é que apesar de Edilson ter confessado ser um ladrão, nenhuma das partidas apitadas por ele sofreu de fato alguma distorção nos resultados, de modo que o Tribunal acabou forçando a barra indevidamente.



(Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 21/10/2016)




sábado, 15 de outubro de 2016





SOB NOVA DIREÇÃO

Quando comecei a escrever este artigo, imediatamente após o término da partida contra a Venezuela que marcou a quarta vitória consecutiva da seleção brasileira sob o comando de Tite, pensei em dar-lhe o título de “Da água para o vinho”, enfatizando a diferença marcante entre o seu desempenho atual e aquele arremedo de futebol praticado pela equipe de Dunga.
No entanto, resolvi por chamá-lo de “Sob nova direção”, um pouco mais contido, por ser o indicador de que o torcedor brasileiro está feliz e confiante com a mudança do comando técnico, da mesma forma com a qual um cliente reage quando um restaurante que andava mal das pernas – e dos sabores – muda de chef, de cardápio e de administração.
A mudança da água para o vinho, diferentemente do milagre operado por Jesus Cristo nas bodas de Canaã, deverá ser sentida gradativamente durante as Eliminatórias na qual ainda teremos pela frente Argentina, Uruguai, Colômbia e outros menos qualificados.
Afinal, não basta mudar de água para vinho, tem que ser vinho de qualidade!
Ganhar de Bolívia e Venezuela não tem o sabor que o degustador aprecia. Mas ganhar jogando bem – muito bem contra a Bolívia e mais ou menos bem contra a Venezuela – sempre ajuda na autoestima e na soma dos pontos fundamentais para nos conduzir à Rússia em 2018.
O devastador toque de bola contra os bolivianos não foi visto na partida contra a Venezuela, e não me parece que a ausência de Neymar tenha algo a ver com isso. Os venezuelanos, com toda a sua limitação, se defenderam melhor, cobriram os espaços com mais propriedade e dificultaram as coisas para os brasileiros. A prova disso é que o primeiro gol aconteceu logo no início, após uma pixotada grotesca do goleiro venezuelano aproveitada com primor por Gabriel Jesus, e o segundo quase no fim, após um chute improvável e muito feliz do atacante Willian.
É claro que deve ser ressaltado o fato de que em tão pouco tempo, nas mãos de um técnico mais competente, o grupo de jogadores – praticamente os mesmos que atuavam na seleção carrancuda de Dunga – conseguir apresentar um futebol com a cara do Brasil que queremos ver.
O futebol da seleção nesta ainda curta mas promissora era Tite vem mostrando uma variedade de detalhes com os quais já nos havíamos desacostumado, como triangulações, deslocamentos, jogadores procurando o vazio para receber a bola em melhores condições, lançamentos mais precisos, volantes mais técnicos e uma defesa segura que sofreu apenas um gol em quatro partidas, mesmo assim um gol contra do zagueiro Marquinhos. Foram doze gols marcados em quatro apresentações, uma prova de que os jogadores voltaram a acreditar no seu próprio potencial.
A agenda de procedimentos de Tite inclui diálogo franco e honesto com os jogadores e com a imprensa, uma interlocução não subserviente com a CBF, técnicas modernas de treinamento e um prudente distanciamento de agentes e empresários.
O fato mais positivo da gestão Tite é que ele conseguiu devolver a confiança ao jogador e ao torcedor, além de mostrar para o mundo o futebol brasileiro que o mundo estava acostumado a ver no século passado.
Chegar ao primeiro lugar nas Eliminatórias da Copa depois de quatro jogos não era nenhuma obrigação, pois o objetivo ainda é a classificação pura e simples para a Copa de 2018. Mas depois de quatro jogos o Brasil chegou lá, e dá mostras que aquelas nuvens negras que toldavam o nosso céu azul de anil foram embora junto com a antiga comissão técnica de tão má lembrança.
O Brasil está disputando um futebol mais leve, mais técnico e envolvente, sem deixar de lado os toques de efeito típicos do futebolista nativo, e os jogadores se viram finalmente livres de implicâncias e ressentimentos por parte da comissão técnica anterior e sabem que a sua convocação e eventual escalação obedecerá apenas a critérios exclusivamente técnicos, sem ranços nem rancor.
Todas as seleções ainda terão de cumprir nove partidas pelo torneio que classificará diretamente os quatro primeiros países classificados e oferecerá uma repescagem intercontinental para o quinto colocado.
Os próximos adversários do Brasil serão a Argentina, que passa por uma crise técnica, e o Peru, que tradicionalmente não nos dá muito trabalho. Se continuar trabalhando com a mesma objetividade das últimas quatro partidas o Brasil tem tudo para carimbar o passaporte para Moscou nos oferecendo um vinho de ótima qualidade. 

  


 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 14/10/2016)