O CARNAVAL DOS OUTROS
Segunda parte
Em alguns lugares deste imenso território verde-amarelo – tomemos, por exemplo,
a cidade de Salvador – o calendário oficial que demarca o carnaval não é
seguido à risca, pois a festa começa com a passagem do ano e termina bem além
da Quarta Feira de Cinzas. Dizem os maldosos que na verdade ele nunca acaba, se
prolongando por todo o ano...
Quanto
ao Rio de Janeiro, parece até conversa de brasileiro, mas o seu Carnaval é visto
como o mais sensacional do mundo, “um teatro a céu aberto”, “uma febre de luzes
e cores”, “uma ópera popular contagiante” ou “um espetáculo de música e
alegria” como o descrevem nossos ufanos jornalistas.
O
fato é que o Rio conseguiu exportar seu modelo de carros alegóricos, adereços e
bateria para Tóquio e – pasmem! – até para Helsinque; também mandou a alegria
dos blocos de rua para Nova York e Buenos Aires, e se mantém absoluto neste
quesito, eis que o Livro Guinness de Recordes aponta o Galo da Madrugada, de Recife,
como o maior bloco carnavalesco do mundo (o bloco mais antigo, ainda em
explosiva atividade, seria o Cordão do
Bola Preta, fundado em 1918, mas o Galo continua cantando mais alto, pelo menos
no Livro).
Apesar
da pujança do Carnaval carioca, muito antes do Zé Pereira sair batendo a sua
lata nas ruas do Rio Antigo e dar o ponta-pé inicial no Entrudo, outros países
já faziam os seus Carnavais do seu próprio jeito, com motivos, fantasias,
música e desfiles que em muito diferem da alegria e dos pecados encontrados no
sul do equador.
Em
Veneza, as festividades começaram no século 17, e têm seu ponto alto nas
máscaras que os nobres usavam para poder sair às ruas e se misturar com o povo
sem serem reconhecidos. As máscaras até os dias de hoje são muito sérias e não
remetem à folia, preferindo se referir ao drama e à comédia do teatro grego.
O
Carnaval de Veneza nasceu nas ruas sob a inspiração dos personagens da Commedia
Dell’Arte – Arlecchino, Pantalone, Colombina, que na nomenclatura portuguesa
ganhou a tradução de Arlequim, Pierrô e Colombina – e passou também para os
salões, sendo festejado durante dez dias a fio.
A
sua música é baseada no folclore italiano, e apesar de alegre e vibrante, não
chegaria a contagiar o folião brasileiro, que iria sentir falta de um ritmo
mais explosivo.
O
Carnaval de Paris talvez não seja tão conhecido, mas faz parte do calendário oficial
da cidade desde o século 16.
Ao
contrário do Carnaval de Veneza, o de Paris nasceu por conta dos trabalhadores,
o que fez com que historicamente ele possuísse menos glamour e riqueza. Além do
mais, ele foi descontinuado entre os anos 1950 e 1993, o que faz com que muitos
parisienses não lhe deem atualmente muita importância.
O
Carnaval de Paris marca, porém, um ponto decisivo na história dos folguedos, pois
influenciou na existência do Mardi Gras, como é chamado o Carnaval de Nova
Orleans.
Existem
outros carnavais pelo mundo afora que reúnem turistas de todas as
nacionalidades, desde o Carnaval de Inverno de Quebec-Canadá até o de
Colônia-Alemanha, passando por Barranquilla-Colômbia e Basiléia-Suiça.
Excetuando
o Rio de Janeiro e possivelmente Salvador, o Mardi Gras – expressão francesa
que significa Terça-Feira Gorda – é o carnaval mais procurado pelos turistas,
chegando a reunir na temporada momesca mais de 4 milhões de pessoas na cidade
de Nova Orleans.
Os
festejos começam a esquentar já no mês de janeiro, mas dez dias antes da terça-feira
gorda a coisa realmente pega fogo, com muita gente participando do clima musical-gastronômico
proporcionado pela cidade.
Músicos
tocam nas esquinas e, é claro, nos bares e restaurantes. No French Quarter, o bairro
mais famoso da cidade, rolam desfiles com carros alegóricos tocando Dixieland –
a marca registrada da Louisiana – e também o blues e outras músicas, sejam elas
caribenhas ou de origem crèole, que é
uma afro-mistura da música européia com a música feita pelos negros no século
19.
Talvez
a diferença fundamental entre os Carnavais de Nova Orleans e do Brasil seja a
dança. Enquanto no Brasil – Rio, Salvador, Recife, Olinda ou onde quer que seja
– os participantes dos desfiles e aqueles que assistem aos desfiles dançam ao
som da bateria que batuca incessantemente ou da charanga que entoa as músicas populares,
na Louisiana os músicos tocam, os participantes desfilam e o povo escuta, no
máximo balançando o corpo e acompanhando o ritmo com os pés batendo no
chão.
As
marcas registradas do Mardi Gras são os desfiles com jeito de banda militar, as
máscaras de gesso, as cheerleaders
(garotas uniformizadas que fazem evolução à frente dos carros alegóricos a
exemplo do que fazem nos intervalos das grandes competições esportivas
americanas), negros trajando um figurino utilizado há mais de cem anos
evoluindo por entre os carros, e algumas moças, na maioria universitárias,
mostrando instantaneamente os seios em troca de colares de contas para
cobri-los novamente.
E
haja camelôs para vender colares...