sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015






FUTEBOL E SAMBA  

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 20/02/2015) 

Terminou o carnaval e todos vamos pouco a pouco voltando à nossa rotina de vida, mesmo que preguiçosamente, pois a volta às atividades exige um pouco de pré-temporada e, em termos de folia, ainda existe algum rescaldo neste fim de semana.
O brasileiro é conhecido por duas paixões quase indissociáveis: o futebol e o samba. No meu caso, tenho em cada uma delas uma história pra contar.
Minha paixão pelo futebol jamais foi integralmente correspondida, pois apesar de escrever sobre futebol e de, modestamente, entender um pouco do riscado, nunca consegui estabelecer um diálogo mais íntimo com a bola, e minhas aventuras com a pelota correndo no gramado se resumem às peladas de rua da infância.
Talvez, a exemplo de alguns experts que jamais conseguiram jogar minimamente, eu pudesse ter sido um bom técnico, pois tenho a chamada visão de jogo, percebo as deficiências de um determinado jogador ou de uma formação inadequada e já “briguei” muitas vezes com treinadores e jogadores nas suas entrevistas quando eles expressam uma leitura errada do jogo em que se envolveram.
Escrevo sobre esporte – mais apropriadamente sobre futebol – há mais de vinte anos, e antes disso já havia participado ativamente do dia-a-dia do métier na qualidade de presidente da infelizmente extinta Sociedade Esportiva Tupan, conhecendo além dos problemas de campo de jogo também os segredos de bastidores e a política desenvolvida nas agremiações e na federação.
Não é, portanto, com surpresa que vejo o futebol brasileiro soçobrar nos dias de hoje, mas isso é um assunto que fica para outro dia.
Estranhamente, em termos de “bola no pé”, tenho mais intimidade com o samba do que com o futebol, pois durante sete anos fui participante de uma escola de samba do grupo especial de São Paulo – a G.R.E.S. Pérola Negra – na qual fazia parte da ala dos compositores e da direção de harmonia.
E fui além, tendo um samba-enredo premiado e apresentado na avenida em 1979, o que corresponde à conquista de um título particular dentro dos títulos alcançados pela escola.
Por isso, creio ter autoridade para comentar o que considero um descalabro, que é qualquer relação mais séria do futebol profissional com as escolas de samba.
O Rio de Janeiro, com certeza o melhor, mais bonito e mais empolgante carnaval de rua do país, sabe muito bem separar as coisas. Nos estádios, Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco fazem a alegria dos seus torcedores. Na Marquês de Sapucaí, Beija Flor, Imperatriz, Mangueira, Mocidade, Salgueiro e Portela, dão empolgação às suas comunidades.
Mas em São Paulo as escolas tradicionais – Camisa Verde, Mocidade Alegre, Nenê de Vila Matilde, Rosas de Ouro, Vai Vai – começaram a dividir espaço com as torcidas organizadas, que invadem uma praia que não é a delas, comprometendo a lisura dos resultados, pois as paixões clubistas dos jurados vão além de uma interpretação racional, e ajudam a promover baderna no momento da apuração.
As escolas de samba Gaviões da Fiel, Mancha Verde e Dragões da Real nada mais são do que agremiações que congregam os associados das torcidas organizadas de Corinthians, Palmeiras e São Paulo – incluindo os delinquentes – que entram no desfile carnavalesco apenas para fazer aquilo que eles mais sabem – arruaça, desrespeito e confronto. Inclusive nas arquibancadas do sambódromo.
Há que separar o joio do trigo, para o bem dos foliões e dos torcedores.

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