quinta-feira, 1 de outubro de 2015







 ECOS DO 7º LENÇÓIS JAZZ & BLUES FESTIVAL

São Luís não tem o hábito de comentar espetáculos artísticos depois que o evento termina. É como se as emoções também fizessem as malas e partissem junto com os artistas que fizeram a cena.
Se por um lado isto pode evitar o constrangimento do redator quando ele precisa comentar os às vezes inevitáveis equívocos ocorridos, por outro lado deixa de manter viva a chama que aqueceu o público por algumas horas e que corre o risco de jamais ser acendida novamente.
Assim, é necessário que se faça um registro para a posteridade.
O 7º Lençóis Jazz & Blues Festival realizado em São Luís foi sem dúvida um dos pontos altos da qualidade musical levada aos palcos da cidade em 2015, posto que reuniu em dois dias, no mesmo local, seis atrações que a cidade terá dificuldade em rever, tal a importância dos músicos e das suas agendas lotadas. Não vou comentar a etapa Barreirinhas, igualmente vitoriosa – que contou com astros internacionais, nacionais e locais – porque não estive lá presente. Deixo a tarefa para um comentarista que possa resumir em palavras o encanto das noites de jazz naquele paraíso.
Mas de Barreirinhas me restou uma conversa descontraída com o pianista Darrell Lavigne, que lá havia se apresentado na semana anterior e veio para São Luís para ministrar um workshop sobre Creole Music e dar algumas pinceladas sobre a música e a cultura de New Orleans, uma prova do amadurecimento do Festival, cujos organizadores merecem o meu aplauso.   
Em São Luís a produção foi também muito feliz não apenas na escolha dos convidados, mas também na sequência que foi estabelecida em ambas as noites do festival, sempre iniciando com uma apresentação jazzística moderna para aquecer as turbinas do bom gosto, passando pela brasilidade da bossa nova para convidar o público a cantar com os artistas e terminando com um mexe-remexe frenético que incluiu elementos do jazz & blues na música mágica dos Beatles e no mais puro black & soul music que convidou o público a deixar as cadeiras de lado e cair na dança.
Tudo começou na noite de sexta-feira, 25 de setembro.
No palco, a primeira atração – o André Marques Sexteto – um grupo que decolou numa viagem maravilhosa e inovadora, misturando sons nordestinos como o baião e pitadas do bumba-meu-boi com o que há de mais progressivo no jazz contemporâneo. André é um gigante de pouco mais de um metro e meio de altura, mas a sua tímida simpatia o faz crescer ainda mais. 
A sonoridade forte dos metais – trombone e trompete – em contraponto com a singeleza das notas do piano e uma criativa inversão entre melodia e harmonia deu a tônica da apresentação do grupo.
O tempo recuou mais de cinquenta anos para dar passagem à bossa cheia de estilo de Roberto Menescal e Wanda Sá, fazendo o público navegar ao som de O Barquinho, Rio e outras composições do par perfeito Menescal & Boscoli e outros compositores que também foram premiados com o passar do tempo.
Menescal é como o vinho, e um vinho muito especial, cujo sabor se encorpa nos nossos ouvidos a cada taça tomada, a cada música executada.
A alegria e o companheirismo mostrados pelos Blues Beatles ainda nos camarins se transferiu para o palco, misturando irreverência e descontração, e revelando uma boa dose de blues com fortes citações dos elementos sonoros da banda de Liverpool.
Donos de uma forte presença de palco e liderados por um vocalista que irradia energia, a banda encerrou a noite num clima de alto astral, deixando antever mais curtição da boa para a noite de sábado.
Sábado chegou, e quem foi à Praça Maria Aragão não se arrependeu.
Começando com o pianista Gadi Lehavi, um menino de dezenove anos nascido em Israel e residente do mundo, que encantou com uma técnica apurada e uma simplicidade emocionante. Seu parceiro, o veterano e competente baixista brasileiro Paulo Russo valorizou in extremis a sua performance musical.
Entre canções jazzísticas interpretadas com rara inspiração, Gadi tocou Pixinguinha e Cartola e também tocou os corações de quem estava presente, num momento de puro encanto, fazendo o público delirar.
Na sequência tivemos a categoria e o carisma de Daniel Jobim, neto de Tom, que levou para o palco a imagem, a voz e os acordes do avô, num momento belo e introspectivo, pois se resumiu exatamente a isso – piano, voz, e uma imagem que lembrava o velho Tom de terno preto e chapéu Panamá, como era do seu feito. “Passarim quis voar”, e desta vez voou para o alto do Corcovado. Sua modéstia cativou a todos, na plateia, no palco e nos camarins.
Faltou o charuto, mas deixa pra lá.
A noite chegou ao seu clímax com os Serial Funkers que abusaram do estilo black não apenas nas músicas como também no look. Comandados pelo cantor Regis Paulino, os Funkers também botaram o pessoal para dançar, esbanjando vitalidade, criatividade nos arranjos, competência e, sobretudo negritude, qualidade essencial para quem deságua na leitura soul, black e funk.
O festival chegou ao fim com aquele gosto de “quero mais”.
Quem perdeu, perdeu.

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