sábado, 1 de dezembro de 2018





A LUXÚRIA
(Excerto)

Luxúria é uma coisa que gera margem a dúvidas.
Apesar de no dicionário ficar subentendido como “o supra-sumo da libertinagem”, isto é, sacanagem da grossa, e também como o “superlativo da natureza em viço” – e eu disse viço, não vício – e palavra não é mais usada na sua forma e dimensão real ou então já não se peca mais como antigamente.
Até o pecado anda perdendo a graça.
Antes era tudo proibido, tudo escondido, saboroso como a maçã do Jardim do Éden, mesmo com o risco iminente de que surgisse um vetusto senhor de barbas brancas e olhar iracundo, o dedo em riste e o cajado a brandir para a expulsão perene do pecador.
Na terra das novelas e da internet, porém, o pecado vai assumindo a sua forma eletrônica, e a sensualidade vai invadindo as nossas casas pelas frestas da porta e da janela, através de livros, revistas, jornais e vídeos, e aí a luxúria se descaracterizou, virou artigo de consumo e, sendo “prêt-à-porter”, perdeu aquela antiga imponência.
Já não se despem as gatotas com os olhos, pois elas já vêm despidas, já não se imagina o que uma freirinha teria de sobrenatural porque ela já é supernatural, já não se escondem segredos por debaixo das batinas franciscanas.
Até a palavra “luxúria” perdeu aquele grandiosismo, aquela magestosidade, aquele lirismo, aquela magia.
Mas a luxúria continua presente no desfile da escola de samba, no espartilho de madame Du Barry, no olhar de Casanova, no busto tridimensional das novas Sofia Lorens, em Baco com seus cachos de uva, no tapete persa, na odalisca e no perfume francês.
Luxúria não é uma mulher vulgar se fazendo de fácil e sim a maior das cortezãs fazendo o jogo do difícil para o amador apaixonado.
Luxúria não é a simples intimidade da alcova e sim a própria alcova transpirando desejos incontidos.
Luxúria é champanhe com cortinas de veludo vermelho ao fundo. E violinos ao luar.
Luxúria não é o “strip”.
Luxúria é o “tease”.   

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