segunda-feira, 27 de outubro de 2014





A CARTILHA DO DUNGA 

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 27/10/2014) 

Ao anunciar a convocação para os amistosos de novembro contra a Turquia e a Áustria, o técnico Dunga aproveitou para passar para a imprensa o novo código de conduta dos jogadores quando a serviço da CBF.
De acordo com o Coordenador Gilmar Rinaldi, não se trata de uma cartilha para disciplinar os atletas, mas de regras de conduta que visam organizar o ambiente dos treinamentos e das concentrações, auxiliando no desenvolvimento das relações entre os jogadores e a Comissão Técnica.
Como “proibição” é uma palavra proibida do novo código de conduta, pode-se dizer que aos jogadores “não é permitido” o uso de bonés, brincos, correntes ou chinelos, objetos que na visão da Comissão Técnica se constituem em uma grave ameaça à disciplina.
Também haverá limitação no uso de aparelhos celulares e outros equipamentos eletrônicos, com a finalidade de manter o jogador focado no motivo principal de ele estar ali.
Outro ingrediente do pacote é a disciplina da hora do almoço, na qual os jogadores só podem se ausentar da mesa depois que o capitão se levantar e declarar que o almoço está encerrado. Mais ou menos como num refeitório de colégio interno nos anos 1960, embora a prática ainda esteja em uso em alguns países asiáticos.
Fica a cargo de o leitor decidir se esta cartilha terá um resultado profilático ou será mais um entrave que militarizará o comportamento dos jogadores, reduzindo a já reduzida alegria que ajuda a descontrair e a melhorar a produção.
Eu, particularmente, acho que uma tabela de deveres é sempre boa na medida em que conscientiza o envolvido, mas é ruim quando gera insatisfação ou resistência no grupo. É preciso que exista uma medida exata entre as regras estabelecidas, a tolerância necessária e o diálogo constante para que os jogadores sintam que estão no caminho certo e que isso é benéfico para o rendimento da equipe.
No entanto, jogador profissional não precisa ser tratado como criança de pré-escola, principalmente os que já passaram por diversas provações até chegarem à seleção. Jogador de seleção é um sujeito rodado que já enfrentou diferentes situações na carreira, e talvez uma conversa séria fosse suficiente, sem necessidade de um código de conduta por escrito.
Se por um lado a disciplina e a organização devem fazer parte de qualquer tipo de empreendimento, pois tendem a equilibrar o comportamento, a padronizar as ações e a ressaltar a hierarquia e a liderança, por outro lado o jogador pode se sentir incomodado no seu lado lúdico, comprometer a criatividade e se transformar em um soldado em campanha ao invés de um atleta disputando um torneio esportivo.
O interessante disso tudo é que Neymar, o jogador que mais revoluciona o visual, os adereços e a informalidade, foi guindado à posição de capitão – posto para o qual não me parece talhado – e caberá a ele ajudar a comissão técnica a fiscalizar os demais jogadores no cumprimento do livro de normas.
Resta saber quem escreverá o manual de conduta da Comissão Técnica no trato com a imprensa, com os adversários e com a arbitragem.
Ao técnico Dunga não falta apenas um livro de etiquetas e boas maneiras em como se comportar em sociedade. Para ele também cairia bem uma cartilha, mas uma cartilha real, dessas que ensinam o bê-á-bá, para que ele pudesse se comunicar com os seus interlocutores de uma forma que não lembrasse o homem das cavernas.
Parece até que ele está tentando ser mais comedido, mas igual ao escorpião que tenta ser bonzinho, seu temperamento é indomável, e bem mais forte do que ele...
Noutra ocasião falaremos dos amistosos e da repercussão da cartilha entre os jogadores.   

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