sexta-feira, 1 de março de 2019






O CARNAVAL DOS OUTROS
Primeira parte

O carnaval brasileiro é o mais famoso do mundo, dizem as boas e más línguas.
Não chega a haver controvérsias, inclusive pela opinião das autoridades no assunto, cronistas mundanos e turismólogos em geral, mas é bom a gente saber, do alto da nossa proverbial verdade, que existem outros Carnavais que não estes cantados pelos sambas de enredo, pelas marchas-rancho, pelas marchinhas, pelos sambas de carnaval, pelo frevo e pelo maracatu, e atualmente pelos ritmos baianos, gostem-se deles ou não.
Enquanto as escolas de samba invadem as madrugadas rasgando as passarelas do Rio de Janeiro, São Paulo e outras capitais brasileiras, e enquanto animados blocos desorganizados vão arrebanhando foliões avulsos pelas esquinas movimentadas das grandes metrópoles ao som de uma charanga improvisada, outras partes do mundo vão fazendo a sua parte.
Afinal, é Carnaval, uma festa que dizem ter seu nome originado no latim “carnis levale” (adeus à carne), ou seja, adeus aos prazeres da carne, ironicamente produzida num período de cinco dias onde a carne (sem trocadilho) abunda.
Apesar de o nome ser derivado do latim, historiadores acham que o evento começou a ser festejado na Grécia entre 600 e 520 a.C., nos cultos onde se agradecia aos deuses pela fertilidade da terra, isto é, gandaia não é coisa dos nossos dias.
Nas grandes confraternizações populares da Grécia daquela época, aí incluindo os Jogos Olímpicos, os protagonistas participavam totalmente nus, vindo talvez daí o feitio dos desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro – aquilo que a televisão não mostra.
A tradição do carnaval grego se espalhou pelo mundo e cada povo passou a festejar de acordo com os seus próprios costumes. A Igreja Católica autorizou a comemoração pagã nos dias que antecediam a quaresma, quando as coisas seriam recolocadas nos eixos. Ao que tudo indica isso aconteceu ao redor de 590 d.C.
De acordo com a tradição, depois do período da orgia deve haver um período de abstinência, jejum e meditação – que no Brasil é usado para começar a temporada de carnavais fora de época.
O carnaval, proposto em diferentes formas, faz parte da comemoração de diversos países. Alguns tipos de Carnaval são claramente baseados nos festejos do Rio de Janeiro, é certo, mas outros se baseiam em uma cultura própria e diferem em forma e conteúdo.
O que existe de semelhante em todos eles é a data da celebração, baseada na quaresma, que marca quarenta dias de jejum – período que Cristo passou jejuando no deserto, antecedendo o domingo de Páscoa, cuja data é fixada como o primeiro domingo depois do aparecimento da primeira lua cheia na primavera do hemisfério norte (confuso, não?).
Assim, estranho que possa parecer, a fixação da data da “carnavalia” foi feita em função de um evento religioso, pois apesar dos relatos históricos que atestam a origem pagã dos festejos, a história moderna situa o início das festividades a partir da implantação da Semana Santa pela Igreja Católica no século 11, antecedidas pelos quarenta dias de jejum, a chamada quaresma.
Assim, “carnis levale” significava um adeus temporário aos prazeres deste mundo durante quarenta dias de jejum e abstinência, e para tanto os homens faziam grandes “festas de despedida”, evidentemente com muita esbórnia e salve-se-quem-puder.
O carnaval da antiguidade durava uma semana e era marcado por grandes festas onde se dançava, comia e participava de alegres libações. Os escravos ganhavam uma semana de licença para fazerem o que bem entendessem e o próprio rei entrava na farra junto com a patuleia – daí surgindo possivelmente a figura do Rei Momo.
Hoje, pelo menos pelo que se observa no Brasil, aquele rei é representado por alguns governantes e algumas celebridades que evitam o contato direto com o povo e preferem se isolar nos camarotes especiais das cervejarias ou frequentar bailes de gala isolados, cuja participação se restringe a convidados especiais.
Mas os escravos continuam tendo a sua semana de folga.  


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