terça-feira, 29 de setembro de 2020

 



AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

FINAL DO CAPÍTULO 13 - O SWING E O JAZZ

           É interessante notar que diversas orquestras utilizaram o idioma e o estilo de Duke Ellington – caso de Charlie Barnet, Hal McIntyre e Dave Mathews – mas acabaram sendo rotuladas apenas como “orquestras de dança” porque jamais chegaram perto da sua genialidade.

Louis Armstrong, que a princípio via o crescimento do swing com certo desprezo por considerá-lo uma apropriação indevida dos músicos brancos sobre a música negra, acabou se rendendo às evidências e terminou por declarar que, naquilo que lhe dizia respeito, jazz e swing eram realmente a mesma coisa, e citava como exemplo os seus próprios arranjos para as músicas “Dinah” e “I Cover The Waterfront”, onde a orquestra tinha uma atuação absolutamente “swingada” mesmo dentro de uma interpretação no estilo predominantemente chicago.

Armstrong completava, dizendo que “a nomenclatura nunca tinha sido o ponto forte do jazz”. No início do século vinte, a música de Buddy Bolden era chamada de jazz, de blues e até de ragtime, e o mesmo aconteceu com Jelly Roll Morton antes de 1920. O próprio traditional jazz teve outras denominações e foi também conhecido por stomp, jazz hot, hot music, new orleans, dixieland, primitive jazz e oldtime jazz. Outros estilos pianísticos tocados na época, como o barrelhouse e o honk-tonk, e mais tarde o boogie-woogie, também eram rotulados como jazz, com o qual mantinham certas similaridades.

Nada mais estranho, portanto, em termos de nomenclatura, do que tentar dissociar o swing do jazz, porque eles são, se não exatamente a mesma coisa, pelo menos parentes muito próximos.

O saxofonista Benny Carter tinha a mesma posição a respeito do assunto. Para ele, uma possível diferença entre jazz e swing residisse apenas na forma como a música era “utilizada”.

O jazz da época (leia-se new orleans, dixieland e chicago) era destinado a um público que preferia prestar atenção no trabalho dos músicos, ouvindo cada detalhe e apreciando a música com movimentos corporais que normalmente se resumiam à marcação do ritmo com gestos de cabeça, batidas com as palmas das mãos sobre os joelhos, ou pancadas com os pés no chão, seguindo o compasso da música, uma ou outra gargalhada de satisfação. Era o negro reverenciando a música negra.

O swing, no entanto, era perfeito para aqueles que gostavam de dançar e sentir o som maciço penetrar pelos poros, sem necessidade de se fixar atentamente na orquestra. Como qualquer outro tipo de música dançante, o swing permitia ao público se manifestar ruidosamente e manter conversas paralelas mesmo enquanto os músicos executavam a sua parte. E, apesar do esmero com que os músicos se vestiam, a atenção das pessoas era geralmente destinada para elas mesmas, seus trejeitos e os seus novos passos inventados. Como se faz numa danceteria do século vinte e um.

Assim, de acordo com Benny Carter, “a palavra ‘jazz’ representava o som que saía de cada instrumento individualmente, movido pela emoção do instrumentista, e a palavra ‘swing’ representava o som total resultante de toda a equipe de executantes, orientada pelo arranjador e pelo maestro”.

O vibrafonista Red Norvo, que comandou diversos quintetos e sextetos, executava swing sem preparar os arranjos, e tudo nascia espontaneamente como acontece com boa parte dos músicos que tocam jazz. Norvo achava que não procedia a ideia de que “swing” significasse “música feita exclusivamente sobre partituras” e considerava que a liberdade do músico de jazz poderia ser usada por a ele sem que houvesse qualquer interferência na interpretação e no resultado final.

Ao contrário de Armstrong e de outros músicos da velha guarda de Nova Orleans, Red Norvo sempre falou do swing com admiração, e considerava o seu advento como “um aprimoramento daquela desagradável doutrina do dixieland” (sic), por mais absurda que possa parecer esta afirmação. Mas Norvo era branco e havia nascido em Beardstown, no Illinois, portanto não teve a oportunidade de participar da festa que se desenvolveu na Louisiana no início de tudo e não foi, assim por dizer, contagiado pelo som dominante do stomp.

Outro vibrafonista, Lionel Hampton, que mais tarde se transformaria também em bandleader, garantia que o swing que ele tocava na orquestra de Benny Goodman era jazz autêntico. Esse jazz ficava ainda mais autêntico quando o swing era tocado pelo quarteto de Goodman, com os dois, mais Teddy Wilson no piano e Gene Krupa na bateria, ou com o efêmero quinteto que contava com a qualidade do guitarrista Charlie Christian.

O que fica claro, e parece mesmo definitivo, é que o jazz como gênero é um todo, sendo o swing uma parte desse todo, assim como os outros estilos anteriores ou posteriores a ele.

O jazz veio do canto do negro, do blues e do gospel e recebeu as influências da música de banda militar, das orquestras europeias e do ragtime. A partir daí, ele fez surgir uma diversidade de estilos, e de estilos dentro de estilos, sem que nenhum estilo tenha se sobreposto a outro. Pelo contrário, cada estilo emergente sempre assumia e admitia elementos provenientes dos outros já existentes.

O swing fez o jazz progredir em direção à modernidade exigida pela tecnologia, pelas engrenagens sociais do século vinte e pelas demandas da “flaming youth” (“juventude inflamada”), jovens que chegavam à pós-adolescência com uma visão artística e cultural diferente da geração anterior e que começaram a impor seu estilo musical preferido no transcorrer dos anos 1920.

Assim, o swing foi se impondo e começando a fazer parte de uma família que teve como ancestral o jazz tradicional (new orleans, dixieland, chicago) e que teria como descendentes todos os estilos do jazz moderno (bebop, hard bop, cool jazz, east coast, west coast, progressive, third stream, mainstream, funky) e do jazz contemporâneo (free jazz, jazz fusion, jazz funk, acid jazz e todas as demais tendências).

 

 

 

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